sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

A Solução Consensual de Conflitos no Novo Código de Processo Civil

Bola da vez
O novo Código de Processo Civil foi sancionado pela Presidente no dia 16 de março deste ano e entrará em vigor em um ano após sua publicação. A grande expectativa é que ele reduza a quantidade de processos, que se arrasta na Justiça há muitos anos.

Entre as principais mudanças está a ampla instigação a autocomposição, para isso todos os Tribunais deverão ter centros judiciários de solução consensual de conflitos, objetivando a realização de sessões e audiências de conciliação e mediação.

Assim, houve a institucionalização da mediação em processos judiciais pelo no novo diploma objetivando dar celeridade à resolução dos conflitos.

A lei sancionada delimita bem o papel do conciliador e do mediador, já que os dois institutos não se confundem. O conciliador tem a prerrogativa de sugerir uma solução e operará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes. O mediador, cuja função é essencialmente restaurar o diálogo entre as partes, para que posteriormente o conflito em si possa ser tratado, atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes.

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios também instituirão câmaras de mediação e conciliação, com as mesmas atribuições no âmbito administrativo.

Cabe aqui destacar o entendimento sobre o assunto da Ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ellen Gracie:

“Para Ellen Gracie, a maior dificuldade será empregar a mediação na administração pública. Pelo novo CPC, os entes públicos devem instalar câmaras de conciliação e arbitragem. Segundo a ministra aposentada, o problema é que a administração não costuma autorizar seus procuradores a transacionar direitos, nem mesmo para resolver a questão na esfera extrajudicial. “O x dessa questão é essa desconfiança com relação aos procuradores. Isso vai demandar uma mudança de mentalidade”

O grande desafio do Poder Judiciário, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, até a entrada em vigor no novo código, será a criação desses centros judiciários, com pessoas capacitadas para dirimir conflitos nas diversas esferas dos direito.

A forma de solução de conflitos disposta no novo código coexistirá com outros meios de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio de profissionais independentes.

Outro método de solução de conflito visando desobstruir o judiciário é a arbitragem, regulamentada pela Lei 9.307/96, que desempenha papel importante no cenário econômico nacional, surgindo na ocasião em que as partes não resolveram de modo amigável a questão. As partes permitem que um terceiro (árbitro), decida a lide, por meio de convenção de arbitragem (cláusula compromissória ou compromisso arbitral),

No novo código a conciliação, a mediação e a arbitragem deverão ser estimuladas por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

O artigo 319 prevê que na petição inicial deverá constar a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação.

O juiz designará audiência de conciliação ou de mediação, que poderá ocorrer em duas sessões ou mais, desde que não ultrapasse dois meses da data de realização da primeira sessão e desde que imprescindíveis à composição das partes.

O código prevê, ainda, que antes de julgar um processo, o juiz será obrigado a tentar uma conciliação entre as partes, independentemente do emprego anterior de outros meios de solução consensual de conflitos.

Vê-se que o objetivo na nova lei é realmente estimular a autocomposição quando preceitua que: não se realizará a audiência de conciliação ou mediação se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse no acordo; a audiência poderá realizar-se por meio eletrônico; e haverá aplicação de multa diante do não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência.

Neste último caso a aplicação da multa poderá gerar discussão, pois o autor indicará na inicial seu interesse na autocomposição, e o réu, caso não tenha interesse no acordo, deverá peticionar sobre seu desinteresse com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência. Em empresas em que o volume de processos e consequentemente citações, intimações e ofícios é alto poderá haver aplicação de multa invariavelmente.

O novo código dispõe, ainda, que antes de julgar um processo, o juiz será obrigado a tentar uma conciliação entre as partes, independentemente do emprego anterior de outros meios de solução consensual de conflitos.

Busca-se como alternativa de solução da lide a composição amigável, pois o direito processual deve estar a serviço do direito material, como um instrumento para a realização deste. Entretanto, cabe também as partes se disporem a resolver o caso, deixando para o poder judiciário a apreciação de processos que realmente mereçam defesa.

Quando uma das partes envolvida é uma pessoa jurídica esta deverá ter como princípio o desenvolvimento sustentável da sociedade. Logo, admitir um erro é adotar uma atitude ética, desafogando o judiciário e colaborando para o desenvolvimento da sociedade como um todo. Isso também gera uma imagem positiva da empresa junto aos consumidores, ao poder judiciário, aos funcionários, aos colaboradores e a comunidade em geral.

Contudo, o novo Código de Processo Civil não conseguirá de forma isolada resolver o problema de afogamento do judiciário, devem ser adotadas várias outras medidas para diminuir o número de processos. Nesse sentido é a opinião do ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, proferida em evento promovido pelo Instituto dos Advogados de São Paulo, em novembro de 2014:

“Temos que sair de uma cultura de litigiosidade e ir para uma cultura de pacificação. E isso será feito pela promoção de meios alternativos de solução de controvérsias, como a conciliação, a mediação e a arbitragem”... O ministro também garantiu aos advogados presentes que a sua gestão no comando do Supremo intensificará medidas para diminuir o número de processos. Lewandowski estimou que o tribunal irá editar de 50 a 100 súmulas vinculantes até o fim de seu mandato, e prometeu priorizar os casos de repercussão geral.

Apesar das críticas e das dificuldades da prática, o novo Código de Processo Civil, quanto ao intuito de promover a composição da lide, está alinhado com as mudanças que precisam acontecer urgentemente no país. A sociedade brasileira atual precisa de um poder judiciário ágil, eficaz e em conformidade com o judiciário de grandes economias mundiais. Muitas vezes os processos são desnecessários e uma conciliação tem o poder de colocar fim a uma longa demanda, cabendo a cada um fazer sua parte.

Bibliografia:
BUENO, Cassio Scarpinella. Projetos do Novo Código de Processo Civil Comparados e Anotados. São Paulo: Editora Saraiva, 2014.
CALMON, Petronio. Fundamentos da Mediação e da Conciliação. Distrito Federal: Editora Gazeta Jurídica, 2013.
LEITE, Eduardo de Oliveira. Grandes Temas da Atualidade V. 07 - Mediação, Arbitragem e Conciliação. São Paulo: Editora Forense, 2005.
MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
SOUZA NETO, Joao Baptista de Mello e. Mediação em Juízo. São Paulo: Editora Atlas, 2012.
Sites consultados:
http://www.conjur.com.br/2014-nov-28/lewandowski-defende-conciliacoes-desafogar-judiciario

Por Por Cintia Franco
Fonte: DireitoNet

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Jurisdição e arbitragem como forma de resoluções dos conflitos trabalhistas

Opinião doutrinária
O presente artigo apresenta as características do procedimento da arbitragem e da jurisdição contenciosa, no que entende por conceito, espécies, funcionamento, comparando-os e demonstrando peculiaridades, que tornam vantajosa a jurisdição, exercida pelo Poder Judiciário perante a técnica arbitral no âmbito da Justiça do Trabalho.
Este trabalho procurou demonstrar que os métodos alternativos de solução de conflito são opções para desafogar o judiciário, entretanto, estes procedimentos não seriam imprescindíveis se ocorresse à desburocratização do judiciário. A utilização da arbitragem, embora traga um procedimento célere, não possui uma segurança jurídica da que se espera no judiciário.
Introdução
Nos últimos anos, a procura pela proteção dos direitos trabalhistas violado nos conflitos de interesse entre empregado e empregador vem aumentando consideravelmente, o crescimento das demandas na Justiça do Trabalho tem como reflexo um conjunto de mudanças na área, o processo de crescimento do País atrelado à procura demasiada de mão de obra e a criação de leis regulamentadoras e estritas, serviram de estímulos que levaram o crescimento da procura pelo judiciário.
Buscando solucionar este conflito, o interessado que teve seu direito violado pode optar por ter sua reivindicação amparada pela jurisdição estatal ou nomear um terceiro. A arbitragem se mostra vantajosa em alguns pontos, uma vez que a justiça convencional ainda detém procedimentos burocráticos que levam ao travamento das ações.
Entretanto, por outro lado, a arbitragem apresenta-se como um método que deixa a desejar no ponto da segurança jurídica se comparado com a jurisdição exercida pelo Poder Judiciário, a carência de procedimentos rígidos é um dos fatores que pode permitir a práticas de atos ilegítimos e favorecer a ausência de neutralidade, tendo em vista que o árbitro privado pode manter relações próximas com a parte e advogados das partes. 
Jurisdição: uma abordagem introdutória
Na contemporaneidade presenciamos diversas formas de conflitos sociais. Estes confrontos precisam ser solucionados, a fim de buscar a efetivação do direito que está sendo violado.
Acerca das aplicações de medidas confiada aos órgãos judiciários, a fim do Estado prestar uma tutela jurisdicional, o jurista Enrico Tullio Liebman se posiciona: “A efetivação das medidas que constituem a sanção civil (...) é confiada aos órgãos judiciários e representa parte importante da função judiciária ou jurisdicional. Esta função não consiste em julgar, isto é, declarar qual seja a regra jurídica estabelecida pelo direito para regular o caso submetido a julgamento, mas também em realizar praticamente a regra sancionada decorrente da inobservância daquela primeira regra, isto é, inadimplemento da obrigação”. (LIEBMAN, Enrico Túlio. Processo de Execução. 1980 p. 04).
Observa-se que o papel do Estado em exercer uma tutela jurisdicional efetiva é de grande relevância, uma vez que as maiorias dos conflitos sociais são direcionados aos órgãos do judiciário visando buscar proteção do direito violado.
Qualidades e vicissitudes da arbitragem e da jurisdição contenciosa
A Lei 9.307/1996 prevê a possibilidade de aplicação da arbitragem nos conflitos que envolvam direitos patrimoniais disponíveis, sendo assim, para submeter impasses ao modelo da arbitragem deve-se analisar preliminarmente a disponibilidade do direito em questão.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, a aplicação da arbitragem nas cinco principais câmaras do Brasil, movimentou desde 2005 R$ 4,9 bilhões, sendo considerado o método de solução dos litígios mais acertado para médias e grandes empresas: “Cerca de R$ 2,4 bilhões foram envolvidos em casos solucionados por meio da arbitragem no Brasil no ano passado. No ano anterior, o número ficou em R$ 867 milhões, segundo levantamento do CBAr (Comitê Brasileiro de Arbitragem). “A arbitragem se tornou modalidade de resolução de controvérsias adequada para médias e grandes empresas”, diz Adriana Braghetta, presidente do CBAr. Desde 2005, quando o levantamento começou a ser feito, as câmaras registraram o valor de R$ 4,9 bilhões em 286 procedimentos.”. (CUNHA, Joana; KIANEK, Alessandra; COELHO, Luciana. Em alta: valores envolvidos em solução de conflitos por meio da arbitragem cresceram em 2009. Folha de S. Paulo. São Paulo, p.02, 08 abr.2010).
Márcio Yoshida discorre sobre a celeridade na arbitragem da seguinte forma: “A celeridade é das melhores qualidades da arbitragem, que se beneficia da irrecorribilidade da sentença arbitral, peculiaridade que abrevia, significativamente, o curso do procedimento.”. (YOSHIDA, Márcio, Arbitragem Trabalhista, p. 133).
A confidencialidade do procedimento arbitral no âmbito trabalhista, em muitos casos é desejada, não raramente nos deparamos com executivos que preferem resguardar sua privacidade, não se expondo negativamente no ramo do mercado que atuam.
A possibilidade de escolha do julgador está na faculdade das partes voluntariamente optarem pela nomeação de um julgador, com especialidades em diversas áreas de conhecimento jurídico e científico e de sua confiança. A celeridade da sentença arbitral também é um ponto positivo do procedimento, a decisão será proferida no prazo estipulado pelas partes, em caso do não ter sido convencionado, o prazo máximo para encerramento do procedimento é de seis meses.
Percebe-se que a arbitragem traz vantagens para o andamento processual, no entanto deve-se haver ponderação, já que as características do procedimento não detêm de uma segurança jurídica ao nível do procedimento da jurisdição contenciosa.
O procedimento jurisdicional também detém vantagens particulares, como por exemplo a imparcialidade do julgador. Nos casos em houver indícios de suspeição e imparcialidade do juiz, a parte deve arguir à impossibilidade do julgamento por aquele magistrado, remeter-se-á os autos ao juízo competente o que não acontece na arbitragem, onde o arbitro é nomeado pelas partes, podendo não ser dotado de imparcialidade, influenciado o julgado.
No procedimento jurisdicional, o julgado ao proferir uma decisão com base nos seus entendimentos pode não satisfazer as expectativas das partes, podendo esta, ser submetida a apreciação de um órgão colegiado, buscando que seu direito seja melhor apreciado.
Desvantagens do método da arbitragem e na Justiça do Trabalho
O modelo da arbitragem pode ser exercido em causas que visam direitos patrimoniais, os direitos do trabalhador não são transigíveis, podendo ser discutido apenas em juízo, não se submetendo as formas alternativas de resolução de lide, e caso assim fosse, haveria incompatibilidade do procedimento com o ordenamento jurídico brasileiro, causando afronta a diversos princípios constitucionais.
Sérgio Pinto Martins discorre sobre a aplicação da arbitragem ao Direito do Trabalho, se posicionando: “Os Direitos patrimoniais admitem transação, no Direito do trabalho o trabalhador não pode transacionar seus direitos diante do empregador, apenas em juízo, não se poderia falar em arbitragem.”. (MARTINS, 2004, p. 01).
As principais desvantagens do instituto podem ser observadas na informalidade dos procedimentos, a fragilidade do método pode ocasionar produção de provas falsas, podendo gerar dificuldades no acompanhamento do processo.
A arbitragem pode ser comprometida se o árbitro não possuir conhecimentos técnicos, adequados para resolver o impasse. Na jurisdição contenciosa, a participação efetiva do juiz na condução do processo, usando do seu poder diretivo (formal e material) e suas faculdades instrutórias, garantem um julgador imparcial. Além do mais, como no juízo arbitral cada parte indica o seu próprio arbitro, tem-se o risco deles atuarem em defesa dos interesses daquele que o tenha nomeado.
A ausência de recursos, com objetivo de proporcionar celeridade ao procedimento arbitral, pode ser considerada como uma desvantagem do método. Se não considerarem justa a sentença proferida pelos árbitros, as partes não podem opor-se a decisão, exceto nas hipóteses do art. 32, Lei da Arbitragem.
Assim posiciona Rocha (2003, p.95): “É sobretudo nas épocas de crise e nos momentos de emergência de tendências conservadoras que é necessário voltar a refletir sobre a natureza e as funções da justiça no contexto do estado democrático de direito e das garantias relativas a tutela jurisdicional. Proclamações como o retorno ao livre mercado, “privatizações”, redução do papel do estado tem implicações extremamente perigosas sob diversos pontos de vistas, e em particular, no que se refere à tutela dos direitos dos mais débeis porque expressam a pretensão de reduzir o sistema jurídico ao mínimo para substituí-lo pela regulação de mercado, que é como sabemos o sistema dominado pela expansão incontrolada do interesse econômico privado e pela lógica brutal das relações de força. O aparecimento da arbitragem como forma de solução de conflitos insere-se nesse contexto e é uma decorrência da idolatria do mercado, da privatização e da redução do Estado e do Direito. Daí a necessidade de estudá-la com atenção para podermos compreender claramente sua significação para os diretos do povo, expostos, agora mais do que nunca, a agressiva invasão dos poderes econômicos e de um poder político que se tornou escravo dos interesses privados.”.
A desigualdade da fórmula arbitral também pode ser observada no momento da contratação, uma vez que o empregador visando adquirir vantagem na escolha deste procedimento, pode utilizar-se de meios coercitivos para que seu subordinado (empregado) aceite a cláusula compromissória, já que, uma vez assinada pelas partes, torna-se obrigatória e vinculante.       
A 8ª Turma do TST, apresentando entendimento consolidado da Subseção de Dissídios Individuais – 1 (SDI-1) confirmou decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, o posicionamento defende que todo trabalhador tem direito a recorrer à Justiça do Trabalho mesmo que tenha firmado contrato com a cláusula se comprometendo a submeter possíveis litígios à arbitragem. Para os ministros da 8° Turma, a arbitragem não pratica efeitos jurídicos no âmbito do Direito Individual do Trabalho.
Desta foram, o preceito legal não é aplicável nas relações de emprego, tendo em vista que apenas é aplicável sobre direitos patrimoniais disponíveis. A jurisprudência desta Corte Superior entende que, os direitos trabalhistas são indisponíveis e irrenunciáveis, posto que se considera existir ausência de equilíbrio na relação entre empregado e empregador.
Observam-se abaixo decisões contrárias ao modelo de arbitragem no âmbito da Justiça do Trabalho: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ARBITRAGEM. RELAÇÕES INDIVIDUAIS DE TRABALHO. INAPLICABILIDADE. DECISÃO DENEGATÓRIA. MANUTENÇÃO.As fórmulas de solução de conflitos, no âmbito do Direito Individual do Trabalho, submetem-se, é claro, aos princípios nucleares desse segmento especial do Direito, sob pena de a mesma ordem jurídica ter criado mecanismo de invalidação de todo um estuário jurídico-cultural tido como fundamental por ela mesma. Nessa linha, é desnecessário relembrar a absoluta prevalência que a Carta Magna confere à pessoa humana, à sua dignidade no plano social, em que se insere o trabalho, e a absoluta preponderância deste no quadro de valores, princípios e regras imantados pela mesma Constituição. Assim, a arbitragem é instituto pertinente e recomendável para outros campos normativos (Direito Empresarial, Civil, Internacional, etc.), em que há razoável equivalência de poder entre as partes envolvidas, mostrando-se, contudo, sem adequação, segurança, proporcionalidade e razoabilidade, além de conveniência, no que diz respeito ao âmbito das relações individuais laborativas. Desse modo, não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui os termos da decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido.”. (TST - AIRR: 25620105020351 2-56.2010.5.02.0351, Relator: Mauricio Godinho Delgado Data de Julgamento: 29/08/2012, 3ª Turma).
Por isso tudo, percebe-se que, embora o procedimento arbitral proporcione algumas vantagens quando comparado à jurisdição contenciosa, este não deve ser aplicado no âmbito do Direito Individual do Trabalho, uma vez que tal procedimento não proporciona um equilíbrio entre as partes em razão da sua fragilidade, gerando insegurança jurídica.
Conclusão
O breve estudo procurou apresentar as características de cada modelo dando ênfase no método da arbitragem e da jurisdição contenciosa no âmbito da Justiça do Trabalho.
O artigo apresentou os principais benefícios do procedimento arbitral, dentre eles a celeridade, confidencialidade e informalidade e as vantagens da jurisdição, como a imparcialidade do julgador, a segurança jurídica o que proporciona um julgamento preciso.
Em vista aos argumentos apresentados, percebe-se que apesar da burocratização encontrada no modelo jurisdicional, este se mostra capaz de oferecer as partes uma segurança jurídica relevante se comparado com os procedimentos da arbitragem.

REFERENCIAS
CUNHA, Joana; KIANEK, Alessandra; COELHO, Luciana. Em alta: valores envolvidos em solução de conflitos por meio da arbitragem cresceram em 2009. Folha de S. Paulo. São Paulo, p.B2, 08 de Abril de 2010.
LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução, 4° ed., São Paulo: Saraiva, 1980.
MARTINS, Sergio Pinto. Arbitragem como forma de solução de conflitos trabalhistas. Disponível em: http://www.taab.com.br/noticia2.asp?cod=9>. Acesso em: 16 jul. 2009.
ROCHA, José de Albuquerque. Instituições Arbitrais In. SALES, Lilia Maia de Morais et AL.Estudos sobre Mediação e Arbitragem. Rio de Janeiro: abc, 2003.
YOSHIDA, Márcio. Arbitragem trabalhista: um novo horizonte para a solução dos conflitos laborais. São Paulo: LTr, 2006.
Sites:
Legislação
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de Outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm
BRASIL, Lei n. 9.307, de 23 de Setembro de 1996. Dispõe sobre a Arbitragem. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9307.htm
BRASIL, Lei n. 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm
Por Raissa da Rocha Cunha Gonçalves é advogada, pós-graduanda em Processo Civil e do Trabalho
Fonte: ConJur

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Questões familiares devem se pautar por técnicas de autocomposição

Melhor opção
Sem sombra de dúvidas, a atuação junto às famílias é merecedora de destaque desde os tempos da “assistência judiciária”, serviço de relevância pública que antecede aqueles prestados pela Defensoria. A razão, a nosso ver, é bastante simples e está diretamente relacionada ao fato de que o direito das famílias constitui a vertente mais democrática do Direito, o que também se explica com facilidade. Afinal, se nem todos os cidadãos estabelecem relações comerciais, trabalhistas ou previdenciárias de relevância jurídica, certo é que, por outro lado, todos constroem ou se veem inseridos em vínculos regidos pelo direito das famílias, cuja tutela abrange período anterior ao nascimento da pessoa (a proteção ao nascituro), acompanhando-a até mesmo após sua morte[1].

Justamente por isso, ainda hoje, quando a atuação institucional é bem mais abrangente, são as questões de família que constituem uma das principais vias de acesso do público assistido à Defensoria. A fim de ilustrar o que se afirma, no caso da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, note-se que o Relatório Institucional de 2014 registrou que cerca de 40% dos atendimentos realizados relacionavam-se ao direito das famílias — já em 2015, cerca de 35%.

Apesar da relevância do tema, notória até mesmo pelo volume da demanda, a seu respeito muito pouco se diz ou se constrói, percebendo-se um certo descuido institucional no que diz respeito à matéria. Algo que, de tão presente, se torna esquecido, como se o simples fato de se tratar de um campo de atendimento realizado há décadas dispensasse questionamentos e reflexões sobre o espaço de construção do direito — e da cidadania — que nos é próprio[2]. Aliás, parece-nos que o menoscabo usualmente dedicado ao direito das famílias durante nossa formação jurídica termina por contaminar a visão institucional acerca da matéria, sempre associada a meras picuinhas emocionais e futilidades egoísticas, amontoadas em campo do saber que dispensa maior esforço crítico ou trato estratégico.

Essas considerações são fruto de reflexões e práticas desenvolvidas há pelo menos dois anos, as quais resultaram em livro que disponibilizamos ao público de forma gratuita[3], a fim de abordar as questões de família sob uma perspectiva defensorial – antecipando, de forma simples e didática, os efeitos das reformas trazidas pelo Novo Código de Processo Civil na prática jurídica que envolva o direito das famílias. Das questões ali trabalhadas, cremos que duas merecem destaque, considerando sua importância estratégica e dimensão prioritária para a Defensoria Pública — especialmente diante da constatação de que as questões de família, como dito, constituem das maiores portas de acesso à instituição.

Referimo-nos, pois, ao campo fértil que se abre pela atuação junto às famílias no que diz respeito à solução extrajudicial de litígios e à educação em direitos. Nesse sentido, ressaltamos a urgente necessidade de superar com criatividade a notória insuficiência do modelo tradicional de simples acesso ao sistema judicial para a solução dos conflitos de família — como há décadas já anunciava Cappelletti —, o que se faz possível justamente pelo investimento institucional na solução extrajudicial de conflitos e na educação em direitos, em efetivação ao que preconizam os incisos I, II e III do artigo 4º da Lei Complementar 80 de 1994.

Muito embora o fato de constarem dos primeiros incisos do artigo 4º da LC 80/1994 já se mostre bastante indicativo da prioridade com que devem ser abordadas questões afetas às soluções autocompositivas e à prevenção de litígios, difícil tem sido a tarefa de tentar transpor essas prioridades do texto para a realidade. É esse o grande desafio que se enfrenta diante da necessidade de se reduzir e mitigar o efeito da hiperjudicialização que há muito emperra o sistema de Justiça. Mas a prática nos mostra que esses obstáculos podem ser contornados com iniciativas simples, como exporemos a seguir, a partir de nossa experiência prática.

Assim, especificamente no que concerne à educação em direitos, compreendemos as dificuldades encontradas para densificação da ideia, retirando-a de um discurso retórico — e, por que não dizermos, “fraco” — para convertê-la em ações efetivas. A experiência cotidiana, entretanto, é frequente em demonstrar que questões a princípio complexas podem, muitas vezes, ser equacionadas a partir de iniciativas simples, com resultados bem significativos.

Nesse ponto, tomando por base o trabalho que desenvolvemos na comarca de Caxias do Sul (RS), no âmbito do Projeto Defensoria das Famílias, destacamos a conveniência e necessidade de envidar esforços no sentido de transformar a cultura de atendimento estabelecido no âmbito da Defensoria, uma vez que, de fato, ainda se limita a reproduzir — com mínimas diferenças — o paradigma consolidado pelos modos de exercício da Advocacia tradicional, de cunho judicializante e litigioso. A necessidade de adequar o trabalho prestado ao volume da demanda e à dimensão pública em que atuamos levou-nos a prestigiar as soluções autocompositivas; a alterar os modos de construção argumentativa das petições — especialmente das iniciais, evitando a apresentação de relatos que pouco contribuem para o bom deslinde do feito e que potencializam o conflito; a prestar uma orientação clara a respeito da possibilidade de insucesso da demanda; a esclarecer o público assistido sobre a demora inerente ao processo judicial, frisando as vantagens da solução consensual; a limitar o ajuizamento em situações de insucesso bastante provável — notadamente em negatórias de paternidade e revisionais de alimentos; a editar materiais de orientação em direitos para diversos públicos — como o “Gibi Cidadão: A Defensoria Pública e as Famílias”, a “Cartilha Cidadã: a Defensoria Pública e as Famílias” e o “Guia Prático do Estagiário”; a investir na realização de palestras em universidades e centros comunitários, dentre outras medidas. Além disso, percebemos a necessidade de auxiliar na produção probatória e na própria organização da vida financeira do cidadão assistido, pelo que formatamos modelos de recibos de pensão alimentícia, tabelas para controle de pagamento e recebimento de pensão, além de modelo de laudo médico para instruir ações de interdição.

Em relação à solução extrajudicial de conflitos, cumpre destacar a iniciativa que denominamos “Dia do Consenso”, que consiste no atendimento, às quartas-feiras, pela manhã, independentemente de agendamento, de todas as pessoas que comparecerem espontaneamente para formalizar acordos no âmbito das relações de família — por certo, de posse dos documentos necessários e acompanhadas das demais partes interessadas. Em cerca de 18 meses, obtivemos significativo incremento no número de acordos, passando de cerca de nove avenças mensais, no final de 2013, para 77, em março de 2015, o que levou à formalização de cerca de mil acordos no contexto de nosso projeto, no período indicado.

Todavia, mais que iniciativas isoladas, frisamos a necessidade de se adotar institucionalmente uma postura prioritariamente conciliatória — ou, ao menos, de arrefecimento do litígio —, seja no âmbito extrajudicial, seja no curso dos processos. Assim, é fundamental que todo o trabalho seja organizado e pautado pela redução da litigiosidade, o que se amarra firmemente com a educação em direitos. Ou seja, por meio da educação em direitos, ao conscientizar o assistido quanto às reais e limitadas possibilidades abertas pelo ordenamento para a solução de suas questões e conflitos, contribui-se para que ele próprio adote uma postura mais crítica e autônoma diante dos obstáculos inerentes aos percursos do litígio judicializado. Esse processo de desmistificação do sistema e das formas jurídicas resultará, naturalmente, em uma postura mais aberta a meios alternativos para a solução de seus problemas, o que inclui as vias da conciliação e mediação, por exemplo, as quais poderão assegurar respostas mais adequadas e eficientes, especialmente diante das especificidades das questões de nosso público assistido.

Convém ressaltar que, quando tratamos da “especificidade” das situações vivenciadas por nossos assistidos, remetemos a contextos fáticos muitas vezes construídos à margem do direito posto e que envolvem, dentre outras tantas hipóteses que o cotidiano nos apresenta, a ocupação de imóveis em áreas de proteção ambiental, negócios jurídicos atípicos envolvendo bens financiados ou imóveis não escriturados, registro de crianças em nome de terceiros que não os pais.

Para nos limitarmos a um breve exemplo, destacamos o caso corriqueiro que envolve partilha de imóveis situados em áreas de proteção ambiental e não escriturados. Esclarecendo, não é incomum que o único bem possuído pelo casal em vias de dissolver a união ou casamento seja justamente um imóvel estabelecido em “área verde” — inclusive com “justo título” —, que tem apelo econômico apesar dos entraves registrais e urbanísticos e que, portanto, não pode ser desprezado na partilha patrimonial.

Contudo, certo é que, para além de reconhecer que caberá a cada divorciando 50% dos direitos econômicos sobre a posse, muito pouco pode fazer o juiz para efetivamente partilhá-lo, já que impossível sua condução à hasta pública, considerando a existência jurídica fantasmagórica do bem. Vale dizer: em não havendo acordo sobre a forma de acomodar a partilha, não há procedimento jurisdicional que assegure o adequado e efetivo resguardo dos direitos em debate.

Em casos tais, portanto, fica evidente a relevância da educação em direitos, justamente para desfetichizar a relação que o assistido mantém com o Direito, conscientizando-o de que a melhor solução para seu caso em muitas hipóteses dependerá mais de seu empenho, criatividade e disposição para o diálogo com a outra parte que da intervenção jurisdicional.

Nesse momento, é também fundamental perceber que, não obstante abordemos, muitas vezes, a solução extrajudicial de litígios, temos diagnosticado em nosso cotidiano que, invariavelmente, o que há é um conflito meramente potencial e latente decorrente da insegurança das partes a respeito do que seria ou não “o certo” a fazer. Ou seja, em razão da erosão de antigos lugares de autoridade — que é a marca de nossos tempos pós-modernos —, à falta do padre e de outros árbitros ou mediadores, ao cidadão resta buscar no Direito uma referência primeira e última do que vem a ser justo para a solução de suas questões, muitas vezes sem que haja, propriamente, um conflito arraigado. Diante dessa realidade, não raro é que a simples orientação acerca do que são as possíveis respostas jurídicas à questão seja suficiente ao desfazimento das dúvidas e restabelecimento da paz social. Ao reverso, a pronta investida judicial em situação como a aventada conduz, muitas vezes, à eclosão de um litígio que até então era apenas potencial.

É imperioso perceber, portanto, que o investimento no manejo conjunto e harmonizado desses dois princípios institucionais propulsores — educação em direitos e solução extrajudicial de conflitos — é fundamental para que o cidadão assistido possa emancipar-se da posição passiva de “objeto de decisão” para assumir o protagonismo nos processos de solução de seus conflitos, o que é mais condizente com as premissas democráticas que têm por objetivo conduzir o cidadão a uma autonomia jurídica e política – que se traduz em cidadania, em última análise. Além de incentivar o engajamento do cidadão na solução ativa de suas controvérsias, concorrendo para sua emancipação, os esforços destacados contribuem para mitigar a frustração com os efeitos de decisões terceirizadas ao Judiciário. 

Desse modo, observa-se um incremento de efetividade no que tange às soluções encontradas a partir da autocomposição e, na mesma medida, uma redução dos processos de transferência da responsabilidade pelo insucesso da pretensão aos atores do sistema de justiça — terceirização de responsabilidades. Enfim, na medida em que participa ativamente dos processos de busca pela solução de suas controvérsias, tornando-se agente de decisão, o cidadão passa a se responsabilizar por seu destino, com o que se observa o início da reversão de um processo histórico de alienação e paternalismo, conforme enfatizamos noutra oportunidade[4].

Portanto, o que concluímos é que a atuação da Defensoria Pública pautada pela educação em direitos e fomento a soluções alternativas de conflitos assegura à população assistida efetivo acesso à justiça — e não só ao Judiciário —, propiciando soluções mais adequadas à realidade concreta vivenciada pela maior parte dos brasileiros. De outro lado, acreditamos que as percepções e construções jurídicas que decorrem deste trabalho cotidiano não devem ser negligenciadas, eis que em muito podem contribuir para a construção de um direito que seja verdadeiramente “das famílias”, objetivo que deve pautar o discurso e o agir institucional, especialmente porque apto a beneficiar significativa parcela de nossa demanda e grande parte da população brasileira, como frisado.

[1] “Ou seja, por se tratar de ser de(em) cultura, o sujeito somente se desenvolve e identifica em suas relações com seus outros, as quais o acompanham do nascimento à morte, podendo-se afirmar que os fatos e problemas relevantes nesse percurso relacional são, em boa parte, objeto do Direito das Famílias. E, se nem todos têm questões patrimoniais que dependam da intervenção judicial ou do recurso ao Direito para serem resolvidas, fato é que, desde o nascimento, todos têm, em igual medida, relações que reclamam formalização de importância jurídica, inclusive para que possam existir perante o ordenamento.” (GODOY, Arion Escorsin de; COSTA, Domingos Barroso da. A atuação da Defensoria Pública, enquanto instituição de transformação subjetiva, social e política a partir do direito das famílias. In: Rosa, Conrado Paulino da; Thomé, Liane Maria Busnello (Orgs.). O papel de cada um nos conflitos familiares e sucessórios. Porto Alegre: IBDFAM/RS, 2014. p. 16)
[2] Sobre nosso espaço de construção de cidadania, interessante registrar comentário feito pela Professora Vera Regina Veiga França, em banca de qualificação de mestrado na Faculdade de Comunicação da UFRGS à qual assistimos. Segundo a professora, em recordação mais ou menos precisa de seus dizeres: “a Defensoria Pública seria como um banquinho, em que sobe o cidadão para falar e ser ouvido, na enunciação de sua cidadania”.
[3] Disponível em: http://manualdasfamilias.editorasaojeronimo.com.br/
[4] COSTA, Domingos Barroso da; GODOY, Arion Escorsin de. Educação em direitos e Defensoria Pública: cidadania, democracia e atuação nos processos de transformação política, social e subjetiva. Curitiba: Juruá, 2014.

Por Domingos Barroso da Costa é defensor público no Rio Grande do Sul, especialista em Criminologia e Direito Público e mestre em Psicologia pela PUC-MG.

Arion Escorsin de Godoy é defensor público no Rio Grande do Sul. Especialista em Direito Urbanístico e mestre em Direito Ambiental, é autor de “Conflitos Habitacionais Urbanos: Atuação e Mediação Jurídico-Política da Defensoria Pública”