Parâmetros para acordo
Vamos hoje comentar um interessante julgado do STJ envolvendo roubo de veículo e serviço de valet parking oferecido por restaurante (STJ. 3ª Turma. REsp 1.321.739-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 5/9/2013).
Vamos hoje comentar um interessante julgado do STJ envolvendo roubo de veículo e serviço de valet parking oferecido por restaurante (STJ. 3ª Turma. REsp 1.321.739-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 5/9/2013).
Imagine a seguinte situação:
Carlos e sua esposa foram jantar em
badalado restaurante da cidade.
Chegando até o local, Carlos deixou seu
carro com o manobrista do serviço de valet
oferecido pelo restaurante aos clientes.
Quando o manobrista estava estacionando
o carro em uma rua que fica ao lado do restaurante, foi abordado por um ladrão,
que, mediante grave ameaça com arma de fogo, roubou o automóvel.
Suponha que Carlos ajuíze uma ação
contra o restaurante. Qual é o tipo de responsabilidade que será analisada
nessa demanda?
O juiz analisará se o restaurante tem
ou não o dever de indenizar o cliente com base no regime da responsabilidade objetiva.
Isso porque o cliente é consumidor e o restaurante caracteriza-se como fornecedor
do serviço de manobrista.
Assim, o pedido de indenização será
baseado na existência de uma relação de consumo e a decisão será tomada tendo
como análise o art. 14 do CDC, que trata sobre o fato do serviço:
Art. 14. O
fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à
prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas
sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 3º - O
fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo
prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa
exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Suponha agora uma situação diferente. Imagine que Carlos tivesse seguro e a seguradora pagou a ele o valor do automóvel. Após indenizar o lesado, a seguradora ajuíza ação de regresso contra o restaurante cobrando o valor pago a Carlos. Qual é o tipo de responsabilidade que será analisada nessa demanda?
Também se trata de responsabilidade objetiva
e a análise da procedência ou não do pedido será feita com base no art. 14 do
CDC.
Segundo decidiu o STJ, na ação
regressiva devem ser aplicadas as mesmas regras que seriam utilizadas caso o segurado
(consumidor) tivesse proposto a ação contra o restaurante (fornecedor). Isso
porque, após o pagamento do valor contratado, ocorre sub-rogação,
transferindo-se à seguradora todos os direitos, ações, privilégios e garantias
do segurado, em relação à dívida, contra o restaurante, de acordo com o
disposto no art. 349 do CC:
Art. 349. A sub-rogação transfere ao
novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em
relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores.
Em outras palavras, a seguradora, após pagar a indenização, passa a ter os mesmos direitos que o segurado tinha. Logo, como o segurado poderia ter cobrado o restaurante com base no art. 14, a seguradora também terá esse direito.
Vamos, então, agora à questão de fundo.
O restaurante, que ofereceu o serviço de valet deverá indenizar o cliente pelo
roubo do veículo, fato que ocorreu quando o manobrista encontrava-se
estacionando o carro em uma via pública?
NÃO. O restaurante que ofereça serviço
de manobrista (valet parking)
prestado em via pública não poderá ser civilmente responsabilizado na hipótese
de roubo de veículo de cliente deixado sob sua responsabilidade, caso não tenha
concorrido para o evento danoso.
Mesmo no regime da responsabilidade objetiva,
nem sempre o fornecedor será condenado a indenizar a vítima. O art. 14, em seu
§ 3º, prevê causas de exclusão da responsabilidade.
Assim, no caso concreto, o fato de o veículo ter sido roubado caracteriza fato de terceiro (culpa exclusiva de terceiro), afastando o dever de indenizar, nos termos do inciso II do § 3º o art. 14 do CDC.
O roubo, embora previsível, é
inevitável, caracterizando, nessa hipótese, fato de terceiro apto a romper
o nexo de causalidade entre o dano (perda patrimonial) e o serviço prestado.
Ressalte-se que, na situação em análise, inexiste exploração de estacionamento cercado com grades, mas simples comodidade posta à disposição do cliente. É certo que a diligência na guarda da coisa está incluída nesse serviço. Entretanto, as exigências de garantia da segurança física e patrimonial do consumidor são menos contundentes do que aquelas atinentes aos estacionamentos de shopping centers e hipermercados, pois, diferentemente destes casos, trata-se de serviço prestado na via pública.
E se tivesse ocorrido um furto (ex: o
manobrista estacionou o carro e, quando voltou para o restaurante, o ladrão,
sem ser percebido, conseguiu subtrair o veículo)?
Nesse caso, o restaurante deveria ser
condenado a indenizar a vítima.
Conforme pontuou o Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, nos serviços de manobristas (valets)
ofertados por restaurantes nas grandes cidades, deve-se estabelecer uma
distinção entre a ocorrência de furto ou roubo de veículo para efeito de
responsabilidade civil.
Nas hipóteses de roubo, caracteriza-se
o fato de terceiro ou a força maior, podendo-se discutir apenas eventual
concorrência do demandado, mediante uma prestação defeituosa do seu serviço,
para o evento danoso (fato exclusivo ou concorrrente).
Nas hipóteses de furto, em que não há
violência, permanece a responsabilidade, pois o serviço prestado mostra-se
defeituoso, por não apresentar a segurança legitimamente esperada pelo
consumidor.
Se o restaurante ficasse dentro de um
shopping, ele responderia mesmo em caso de roubo?
SIM.
A ocorrência de roubo não constitui
causa excludente de responsabilidade civil nos casos em que a garantia de
segurança física e patrimonial do consumidor é inerente ao serviço prestado
pelo estabelecimento comercial.
Assim, haverá responsabilidade mesmo em
caso de roubos, se o evento ocorrer em supermercados, bancos, shopping centers, enfim, empresas que
fornecem estacionamentos aos seus consumidores como técnica para captação de
clientela, não apenas em face do conforto, mas também da segurança oferecida,
que se torna uma legítima expectativa do público consumidor. Nesse sentido:
(...) De acordo com os ditames do
Código de Defesa do Consumidor, os shoppings, hotéis e hipermercados que
oferecem estacionamento privativo aos consumidores, mesmo que de forma
gratuita, são responsáveis pela segurança tanto dos veículos, quanto dos
clientes.
Aplicação, ainda, da inteligência da
Súmula 130/STJ. (...)
(EREsp 419.059/SP, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 11/04/2012)
(...)É dever de estabelecimentos como
shoppings centers e hipermercados zelar pela segurança de seu ambiente, de modo
que não se há falar em força maior para eximi-los da responsabilidade civil
decorrente de assaltos violentos aos consumidores; (...)
(REsp 582.047/RS, Rel. Min. Massami
Uyeda, Terceira Turma, julgado em 17/02/2009)
Fonte: Dizer o Direito
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