No Brasil, o Setor Técnico da Psicologia dos Foros Regionais e Central e os Tribunais de Justiça dos Estados vêm buscando formas menos traumáticas para lidar com os conflitos familiares: é a mediação, na qual o psicólogo procurará, através de reuniões e entrevistas com os membros da família, facilitar a comunicação entre estes, no sentido de buscar uma solução que seja mais adequada e favorável para todos, principalmente no que se refere à preservação dos direitos das crianças e adolescentes. Mas essa função ainda é incipiente no país, e ainda precisa ser ampliada.
Na mediação, o psicólogo atua como terceiro neutro na relação, e não opina, não sugere, não decide e não impõe nada: espera e auxilia que as próprias pessoas encontrem uma solução para o conflito familiar, a partir de diálogos, orientação e entrevistas. Uma vez encontrada a "solução" para o conflito, este passa a ser um compromisso de todas as pessoas envolvidas – até porque essa solução partiu deles mesmos, e não do psicólogo, o que a torna mais autêntica.
Grunspun (2000) propõe a existência de uma nova profissão: a de mediador familiar, ainda inédita no Brasil, mas já difundida em outros países. Segundo ele, o mediador familiar é um profissional voluntário, que deve estar preparado para alcançar um acordo nas controvérsias, conflitos e litígios, junto aos casais e famílias que buscam esse tipo de solução. Sua ação é na comunidade e pode intervir em famílias íntegras em via de separação agindo de forma preventiva, bem como durante ou após a separação, se surgirem problemas para criar e educar os filhos nas novas formas de família. Poderá também ser procurada por indicação do juiz, antes de exarar a sentença para orientação e mediação. Porém, ainda que no Brasil não exista a Lei de Mediação, o mediador passaria a atuar segundo um Código de Ética próprio, que o impediria de utilizar seus conhecimentos especializados para influir nas decisões: ele apenas deve analisar e compreender a estrutura e comunicação inter-familiar, e auxiliar na busca de soluções para os conflitos emergentes.
A importância do mediador familiar se deve ao aumento crescente dos divórcios e das novas formas de família que surgem após as separações. Essa nova profissão exigiria uma interface entre os vários conhecimentos que lidam com casais, filhos, famílias e comunidade. Então, segundo Grunspun (2000), o mediador familiar pode ser um psicólogo, assistente social, advogado, sociólogo, médico etc. O importante é que esteja preparado para lidar com o conflito familiar, centralizando o trabalho da mediação no melhor interesse dos filhos, e planejando as novas formas de família, respeitando a idade dos filhos em seu desenvolvimento, protegendo-os de futuras contendas entre os pais, e principalmente facilitando a comunicação entre os pais acerca da educação e futuro dos filhos.
O grande indicador para a necessidade da mediação é a ruptura da homeostase familiar, isto é, do equilíbrio interno, dinâmico e adequado das motivações, afetos, conhecimentos e poder no ambiente familiar. Durante o convívio familiar, os casais podem passar por várias crises e se recuperam. Quando a crise é intensa e insuportável, o casal se separa. Quando as crises se tornam freqüentes, basta às vezes uma pequena ruptura do equilíbrio, e essa corresponde à ruptura definitiva do casamento. Mas é preciso entender que nem a separação nem o divórcio acabam com a família: ocorre uma transformação da família. Então, novas formas de famílias construídas por adultos podem criar conflitos de guarda ou de pensão alimentícia para os filhos e requerem novo processo que pode ser muito mais longo do que o processo de separação ou divórcio. Na mediação, o plano familiar deve prever novas situações para essas novas famílias, com menores prejuízos para os filhos.
O psicólogo pode ser mediador e, para exercer essa tarefa, deverá utilizar técnicas e estratégias para chegar a um acordo e a um plano de família após a separação (ou divórcio) visando a centralização do processo no bem-estar físico e emocional dos filhos, que deverá ser referendado pelo juiz. Essas estratégias e técnicas procuram evitar a exteriorização de emoções negativas (medo, hostilidade, ódio, vingança, depressão, acusações, cobranças, ameaças e falsidades) entre as partes. Na função de mediador, o psicólogo poderá indicar, com anuência das partes, psicólogos para avaliação, para laudos ou terapias que podem perdurar durante o processo de mediação ou se prolongar após a separação.
Os objetivos da mediação familiar são:
"Evitar que as partes tomem decisões precipitadas a respeito de seus conflitos;
Oportunizar que as soluções sejam encontradas pelas pessoas diretamente envolvidas e não decididas por outras;
Esclarecer as reais necessidades e interesses de todos os envolvidos, para que as soluções sejam satisfatórias e cumpridas através de acordos viáveis;
Ajudar os envolvidos a exercer sua livre capacidade de tomar iniciativas com responsabilidade, cooperação e respeito mútuo;
Favorecer maior flexibilidade dentro da organização e relações familiares."
(fonte: http://www.terapiadefamilia.org/html/artigos)
Isso não significa que a mediação é mágica na resolução de conflitos. As emoções são as mesmas, mas há alguns facilitadores, entre os quais o mais importante é a busca voluntária da mediação para o acordo entre as partes. Na mediação, as partes podem estar acompanhadas por advogados como assessores, psiquiatras ou psicólogos como conselheiros. O mediador, ouvindo como terceiro neutro e imparcial todos os profissionais úteis para as partes, aproveitará o consenso de todas as contribuições dos especialistas para ter elementos facilitadores para o acordo. No caso do divórcio, por exemplo, o relatório final deverá ser redigido pelo mediador, e apresentado por um advogado aceito pelas partes para o juiz homologar.
Mas a mediação pode apresentar algumas dificuldades, principalmente quando decisões procuradas ferem algum legislação ou direitos constitucionais, ou quando a solução só pode se realizar na área do Direito Penal (ex.: enquadramento da vitimização nos casos tipificados em lei penal), quando há dissimulação entre as partes, ou ainda quando o mediador e/ou as partes estão convictos de que o processo judicial é a melhor saída para o caso. Além disso, o mediador pode esperar que qualquer das partes desista da mediação a qualquer momento e procure advogado para defender seus interesses.
(Extraído do livro da autora: SILVA, Denise Maria Perissini da. PSICOLOGIA JURÍDICA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO. São Paulo: Casa do Psicólogo Editora, 2003.)
BIBLIOGRAFIA:
GRUNSPUN, Haim. Mediação Familiar – o mediador e a separação de casais com filhos. São Paulo: LTr Editora, 2000.
GRUNSPUN, Haim. Mediação familiar: Revista Catharsis, São Paulo, Marigny & Kerber Editores Ltda., n.31, mai/jun/2000, pp. 5-8.
[s.a.] O que é Mediação Familiar? Terapia de Família. São Paulo. Disponível em: . Acesso em 19 mar. 2003.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICANÁLISE DE SÃO PAULO. Psicanálise e Direito. In: SIMPÓSIO PSICANÁLISE E DIREITO. 2003, São Paulo. Anais.
Denise Maria Perissini da Silva é psicóloga clínica, assistente técnica jurídica civil e mediadora familiar em São Paulo (SP) – Brasil. Ministra cursos, palestras e grupos de estudos de temas de Psicologia Jurídica. Autora do livro PSICOLOGIA JURÍDICA NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO, publicado pela Casa do Psicólogo Editora, São Paulo, 2003. Discente de Especialização em Rorschach pela Sociedade Rorschach de São Paulo. Autora de artigos de temas de Psicologia Jurídica em revistas especializadas.
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