Distinção
A
compreensão da diferença entre o conceito de mediação e
conciliação é importante não apenas pela relevância da matéria
em si. No Direito Processual do Trabalho, é possível afirmar que
tal relevância é ainda maior, em função do impacto que a
incompreensão do tema possa estar provocando. Além disso, não se
pode ignorar a contribuição determinante do novo Código de
Processo Civil para o esclarecimento dos referidos conceitos.
Não é de hoje que se discute no campo teórico a diferença entre os
conceitos de conciliação e mediação.
Porém,não se pode ignorar que tanto a mediação quanto a conciliação
consistem em formas de buscar a solução autocompositiva com o
auxílio e a participação de um terceiro.
No caso do Direito Processual do Trabalho, paralelamente à distinção
apontada, outro fator a se considerar consiste na falta de definição
por parte da CLT sobre se o termo conciliação corresponde a
processo (em sentido amplo) ou resultado. No artigo 831, caput e
parágrafo único, a conciliação é tratada como resultado, ou
seja, como solução autocompositiva. Já o artigo 764, caput, trata
a conciliação como processo, ou seja, caminho para a tentativa de
busca da solução autocompositiva. Basta no primeiro caso (do artigo
831) substituir a palavra conciliação por “solução
autocompositiva”, e, no segundo caso (do artigo 764), por “processo
de tentativa de busca da solução aucompositiva”.
Portanto, nem mesmo a CLT é precisa quanto ao alcance do termo conciliação.
Independentemente da referida imprecisão e tentando compreender a diferença entre
conciliação e mediação, um primeiro critério passível de
consideração seria o de que a tentativa de autocomposição fora do
Judiciário consistiria em mediação, ao passo que dentro do
Judiciário seria conciliação. Isto é, trata-se do critério
dentro/fora.
Para chegar à adoção do referido critério, principalmente no processo
do trabalho, bastaria considerar que a CLT utiliza a expressão
“conciliação”, não utilizando o termo “mediação”, bem
como trata da busca da solução autocompositiva dentro do
Judiciário. Já a Lei 13.140/2015, que teria como objeto a mediação,
inclusive sendo chamada de Lei da Mediação, cuidaria do que ocorre
fora do Judiciário.
E, com isso, estaria sacramentado o critério dentro/fora.
Porém,
um primeiro problema com a referida compreensão é que, por um lado,
a própria CLT também trata da busca da solução autocompositiva
fora do Judiciário e, para tanto, utiliza a expressão
“conciliação”. No caso, cuida-se das Comissões de Conciliação
Previa, previstas nos artigos 625-A e seguintes. Vale salientar que a
CLT não utiliza a expressão Comissões de Mediação Prévia.
Por outro lado, a Lei 13.140/2015 também trata da autocomposição
alcançada dentro no Judiciário.
Portanto,
sob o referido prisma, o critério dentro/fora não resolve. E se tal
critério não resolve, qual deveria ser adotado?
Deveria ser adotado o critério funcional, lógico e coerente previsto no
artigo 165 do novo CPC. Conforme o parágrafo 2º do referido
dispositivo, o conciliador consiste naquele que contribui com o
alcance da solução autocompositiva, formulando propostas e adotando
postura avaliativa. Já conforme o parágrafo 3º do mesmo artigo 165
do novo CPC, o mediador consiste naquele que busca o acordo sem
formular propostas, se limitando a estimular o diálogo.
Assim, a diferença entre conciliação e mediação é dada pelo critério
relacionado ao nível de atuação do terceiro neutro que atua para
buscar a autocomposição. Fazendo propostas, estamos diante de
conciliação. Se não faz propostas e somente procura estimular o
diálogo, trata-se de mediação.
Em vez do critério dentro/fora, adotou-se, portanto, o critério que
leva em consideração o nível de atuação do terceiro facilitador.
Porém, ainda na tentativa de manter vivo o critério dentro/fora, seria
possível invocar o artigo 1º da Lei 13.140/2015, o qual estabelece
que, “considera-se mediação a atividade técnica exercida por
terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito
pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver
soluções consensuais para a controvérsia”. E, com isso, se
alegaria que na mediação o terceiro pode ser escolhido pelas
partes, o que ocorreria fora do Judiciário.
Todavia, o artigo 168 do novo CPC permite a escolha tanto do mediador quanto
do conciliador. Portanto, não é a escolha das partes que distingue
um do outro.
E, com isso, definitivamente, o que distingue conciliação de mediação
consiste na postura do terceiro facilitador, e não no critério
dentro/fora.
Nesse sentido, tal distinção vale inclusive para o juiz do Trabalho. Ou
seja, se este faz proposta, será conciliador e estará fazendo
conciliação. Se apenas estimula o diálogo e não faz proposta,
será mediador e estará fazendo mediação.
Porém, ainda raciocinando no processo do trabalho, seria possível
questionar o que fazer com o parágrafo único do artigo 42 da Lei
13.140/2015, o qual estabelece que “a mediação nas relações de
trabalho será regulada por lei própria”.
Respondendo tal possível indagação, basta considerar que isso se aplica às
câmaras de mediação, previstas nos artigos 167 e 174 do novo CPC.
Se assim não fosse, teríamos que concluir que o juiz do Trabalho, ao
conduzir audiências voltadas à autocomposição, sempre seria
obrigado a formular propostas e jamais poderia se liminar a estimular
o diálogo, o que seria uma afronta ao próprio artigo 764, parágrafo
1º da CLT, por consistir em limitação ao poder do magistrado.
Por outro lado, tecnicamente, a depender do conflito, existem situações
nas quais o ideal seria o estímulo ao diálogo, e outras nas quais o
ideal seria a formulação de propostas. Em muitas situações, o
adequado é que a proposta de acordo venha das partes, cabendo ao
terceiro neutro estimular o diálogo para que isto ocorra. Já em
outras, convém que o terceiro apresente possibilidades de soluções.
Dessa forma, seria absurdo considerar que o juiz do Trabalho não pode agir
como mediador. Pelo contrário, pode e deve nas situações que assim
exigir.
E, independentemente das circunstâncias do conflito, há uma questão
de perfil em jogo. Existem magistrados que não se sentem à vontade
para formular proposta, tendo estilo mais compatível com o incentivo
ao diálogo, ou seja, com o estilo da mediação.
Com isso, é forçoso concluir que, se no âmbito de audiência voltada à
busca da solução autocompositiva na Justiça do Trabalho o juiz do
Trabalho se limitar a estimular o diálogo e não formular proposta,
estaremos diante de mediação. Se esse mesmo juiz do Trabalho adotar
postura mais ativa e formular proposta, estaremos diante de
conciliação.
E assim, apesar de todos os traumas e dificuldades psicológicas que
tal constatação possa provocar, somos forçados a chegar à
conclusão de que pode haver mediação no processo do trabalho.
Basta que aquele que conduz as tratativas entre as partes faça o que
está descrito no parágrafo 3º do artigo 165 do novo CPC.
Por Rogerio Neiva Pinheiro, é juiz do Trabalho da 10ª Região, membro do Comitê Gestor da Conciliação do Conselho Nacional de Justiça, juiz auxiliar da Vice-Presidência do TST e membro da Comissão Nacional de Promoção à Conciliação do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Foi coordenador do Núcleo de Conciliação do TRT-10 e coordenador do Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Conciliação da Justiça do Trabalho.
Fonte: ConJur