quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Perfil dos Meios Consensuais e Critérios para sua Adoração



Formas autocompositivas
A resolução de disputas caminha por métodos facilitadores (como a negociação e a mediação) e por meios com maior grau de avaliação que variam de recomendações a mecanismos vinculantes (como a arbitragem e o juízo estatal) 1

Métodos facilitadores são referidos na tradição jurídica brasileira como meios de autocomposição (“meios consensuais”).

A autocomposição será bilateral quando contar coma participação de todos os envolvidos na situação controvertida sem haver uma terceira pessoa apta a decidir o conflito; nessa perspectiva, os meios consensuais poderão se verificar por negociação, conciliação ou mediação.

Quando encaminham a composição por si mesmas estabelecendo tratativas diretas sem a intermediação de uma terceira pessoa, as partes encerram negociação.

Na perspectiva negocial, considera-se que em regra a solução da disputa é mais eficiente quando o método tem como enfoque primário os interesses das partes. Afinal, nada se revela menos custoso e mais eficiente do que as próprias pessoas conseguirem resolver a controvérsia pela negociação direta e franca que possibilite: a) a criação de opções vantajosas para todos os envolvidos; b) a distribuição de valores com base em critérios objetivos acordados pelos próprios envolvidos2.

Quando o enfoque nos interesses não for suficiente para resolver a disputa sem a intervenção de um terceiro (em muitos casos não é), deve-se ponderar: qual método é mais adequado para abordar o impasse considerando-se que o método deve se adequar à disputa? 3.

Pode ocorrer que as partes não consigam (sozinhas ou com seus advogados) comunicar-se de forma eficiente e entabular respostas conjuntas para a composição da controvérsia; a deterioração da relação, dentre outros fatores, pode acarretar graves problemas de contato4

Nessas situações, pode ser produtivo contar com um terceiro imparcial que contribua para a restauração do dialogo por meio da mediação ou da conciliação.

Nos mecanismos consensuais o terceiro que facilita a comunicação atua com imparcialidade sem incorrer em julgamentos. A definição do conflito não é imposta por alguém exterior ao conflito, mas construída conjuntamente pelos envolvidos na controvérsia,que reorganizam suas posições 5.

Quando devem as partes buscar os meios consensuais? E quando devem se valer de métodos impositivos (adjudicatórios/relativos a heterocomposição), em que uma terceira pessoa decide quem tem razão?

Na doutrina americana Frank Sander e Stephen Goldberg estabeleceram critérios para adequar o método à espécie de conflito que se busca resolver.

O primeiro critério para em tender qual é o meio mais adequado considera os objetivos das partes com a resolução da disputa, sendo os usuais: (i) minimização de custos; (ii) celeridade; (iii) privacidade/confidencialidade; (iv) manutenção/aprimoramento do relacionamento; (v) revanche; (vi) obtenção de uma opinião neutra; (vii) criação de precedente; (viii) maximização ou minimização de recuperação 6.

Infrutífera a negociação direta entre os envolvidos na controvérsia, a mediação7 como escolha subsequente, por exemplo, satisfaz melhor os itens i, ii, iii e iv citados, mas não é o melhor mecanismo para os demais anseios.

A arbitragem, por seu turno, atende melhor à necessidade de obter uma opinião neutra de terceiro e de maximizar/minimizar recuperação (itens vi e viii) 8.

O segundo critério para avaliar qual é o melhor mecanismo, segundo os autores, diz respeito aos impedimentos ao acordo e aos meios de ultrapassá-los; eis os mais comuns: (i) comunicação falha; (ii) necessidade de expressar emoções; (iii) diferentes visões dos fatos; (iv) diferentes visões do direito; (v) questões de princípio; (vi) pressões de constituintes; (vii) ligações com outras disputas; (viii) existência de múltiplas partes; (ix) conflitos de agência e (x) “jackpot syndrome” (síndrome de preferir arriscar para atingir o
benefício máximo) 9.

Os autores recomendam que a análise sobre a escolha do método adequado à disputa faça distinção entre o interesse público e o interesse privado das partes. Há casos em que uma parte prefere a revanche ou a vingança mesmo que para isso precise se valer de um método mais custoso; todavia, não é conveniente ao interesse público o gasto de tantos recursos com a resolução de tal disputa, sendo mais interessante, pela perspectiva do interesse público, que as partes busquem superar consensualmente suas diferenças 10.

Em alguns casos, meios facilitadores como a negociação e a mediação podem ser menos benéficos ao interesse público do que a adjudicação; são exemplos: (i) os casos em que a tomada de decisão se torna um precedente que traz segurança e previsibilidade a outras disputas semelhantes; (ii) os casos de má-fé ou fraude em que decisões ajudam a estancar violações recorrentes; (iii) os casos em que há necessidade de sanção ou coerção estatal; (iv) os casos em que uma das partes é incapaz de negociar efetivamente, havendo comprometedor desequilíbrio em termos de poder e habilidades11.

Como se percebe, vários aspectos precisarão ser objeto de conversação entre a parte e seu advogado para que possam identificar se a mediação ou a conciliação são pertinentes logo no início do processamento da demanda.

Externar a preferência pela adoção de um ou outro mecanismo consensual quando tiverem oportunidade de se manifestar nos autos contribui decisivamente para o encaminhamento à via mais adequada12.

Fonte: Mediação e Conciliação - Revista Científica Virtual. Edição 23
 
1
TARTUCE, Fernanda; FALECK, Diego; GABBAY, Daniela. Meios alternativos de solução de conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2014, p. 7.
2
TARTUCE, Fernanda; FALECK, Diego; GABBAY, Daniela. Meios alternativos de solução de conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2014, p. 8.
3
TARTUCE, Fernanda; FALECK, Diego; GABBAY, Daniela. Meios alternativos de solução de conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2014, p. 7.
4
Diversos fatores podem obstar o diálogo produtivo, como o desgastante histórico da controvérsia, a existência de graves falhas na comunicação, o apego a posições contundentes e o desejo de atender a expectativas (algumas vezes externas) de acirramento do conflito, entre outros.
5
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. 2ª ed. Método: São Paulo, 2015 – edição eletrônica, item 1.3.2.3.
6
GOLDBERG, Stephen; SANDER, Frank. Fitting the Forum to the Fuss: A User-Friendly Guide to Selecting an ADR Procedure. 10 NEGOT. J. 49, 49-68 (1994).
7
Na doutrina americana não se costuma falar em conciliação, sendo o termo mediação o mais usado.
8
TARTUCE, Fernanda; FALECK, Diego; GABBAY, Daniela. Meios alternativos de solução de conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2014, p. 8
9
Fitting the Forum to the Fuss, cit.
10
TARTUCE, Fernanda; FALECK, Diego; GABBAY, Daniela. Meios alternativos de solução de conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2014, p. 7
11
Fitting the Forum to the Fuss: A User-Friendly Guide to Selecting an ADR Procedure. Frank E.A. Sander & Stephen B. Goldberg, 10 NEGOT. J. 49, 49-68 (1994).
12
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis, cit., Item 1.3.2.3.2, p. 48.

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