sábado, 8 de março de 2014

A cláusula compromissória e os procedimentos cautelares.

Fique por dentro
O termo arbitragem é derivado do latim arbiter, que significa juiz, jurado. A Lei de Arbitragem no 9.307, de 23/09/1996, conhecida como Lei Marco Maciel foi criada especificamente para introduzir no sistema brasileiro, o juízo arbitral, porém não traz em seu texto nenhum conceito objetivo e explícito do instituto.

Segundo o Professor Charles Jarrosson, em sua tese de doutorado que trata do tema “noção de arbitragem”: “A arbitragem é a instituição pela qual um terceiro resolve o litígio que opõem duas ou mais partes, exercendo a missão jurisdicional que lhe é conferida pelas partes”.

O conceito, considerado clássico, do Professor Phillipe Fouchard revela que: “Pela arbitragem, as partes convêm submeter o litígio ao julgamento de particulares que elas escolheram”. Importante citar também outra definição tradicional, apresentada por René David: “A arbitragem é uma técnica que visa dar a solução de uma questão, que interessa as relações entre duas pessoas, por uma ou mais pessoas – o árbitro ou os árbitros – que detêm os seus poderes de uma convenção privada e julgam com base desta convenção, sem serem investidos desta missão pelo Estado”.

É importante notar que os conceitos colacionados acima são recorrentes em abordar o tema da arbitragem salientando que tal procedimento se dá em âmbito privado; que o julgamento se dá por particulares, a quem as partes conferem o poder jurisdicional.

Em termos jurídicos mais simplistas, a arbitragem é uma forma de solução pacífica de controvérsias, um caminho alternativo ao poder jurisdicional estatal, que se torna competente por convenção e escolha das partes, para dirimir os conflitos. Ao final do procedimento arbitral as partes poderão celebram um contrato ou um acordo.

São importantes princípios que norteiam a arbitragem, dentre outros: autonomia da vontade e a boa-fé entre as partes; a função jurisdicional conferida ao árbitro e sua imparcialidade; a autonomia da lei arbitral e a competência, conferida pela cláusula compromissória. O procedimento arbitral também carrega as seguintes qualidades: a simplicidade, objetividade, sigilo e rapidez do procedimento arbitral, que se sobrepõem à complexidade, prolixidade, publicidade e, sobretudo, à morosidade do processo judicial.

Ao contratar, as partes podem, munidas de sua autonomia, celebrar cláusula compromissória, como medida de prevenção do interesse das partes em garantir que seja adotado o procedimento arbitral para a dissolução de divergências futuras. Nesse sentido, as partes, prevendo desentendimentos, já pactuaram que a solução do caso será decidida por meio de arbitragem.

Recomenda-se que seja utilizada a cláusula compromissória com texto abrangente, que contenha todas as informações mínimas necessárias para dar início ao procedimento arbitral. A cláusula deve ser lavrada por escrito no próprio contrato ou em documento que se refira a ele, como por exemplo, em termo de aditamento ao um contrato principal.

É importante lembrar que alguns casos litigiosos demandam a propositura de um procedimento cautelar, para que se possa resguardar direitos futuros de alguma das partes. No entanto, a Lei de Arbitragem no 9.307, de 23/09/1996, que impulsionou a arbitragem brasileira, não traz em seu texto qualquer disposição que regule procedimentos cautelares em foro arbitral; a possibilidade de sua ocorrência ou outras considerações.

Dessa forma, a parte que necessita de um procedimento acautelatório ainda deverá ingressar com uma ação judicial, utilizando-se do Poder Jurisdicional Estatal, para que não veja o seu direito perecer. 

Os juízes brasileiros têm aceitado os pedidos cautelares e dado prosseguimento às demandas, cujo contrato prevê a adoção de juízo arbitral em caso de divergência, sem maiores questionamentos. A parte deve informar, no entanto, que o resultado da demanda liminar deverá ser remetida a um juízo arbitral principal.A controvérsia se dá, em certos casos, quando as partes adotam cláusula compromissória pouco abrangente ou mesmo omissa. Problemas e dúvidas podem surgir quanto ao foro competente para o regular processamento do procedimento cautelar. 

As partes, ao celebrar o compromisso arbitral podem deixar de eleger um foro competente para um eventual procedimento cautelar, e daí, poderão surgir múltiplas interpretações: qual seria o foro competente? Poderia ser o domicílio do autor, o domicílio do réu, nos termos do Código de Processo Civil Brasileiro, o domicílio do bem objeto de uma eventual perícia em uma ação cautelar de produção antecipada de provas, ou até mesmo o foro da arbitragem, que pode ser diferente de todos os outros mencionados.

Nesse sentido, o compromisso arbitral, que foi celebrado com o intuito de dar celeridade e objetividade à resolução dos conflitos que poderiam advir da contratação, se torna um problema, porque simplesmente se olvidou de eleger o foro caso fosse necessário o ajuizamento de uma demanda cautelar. O texto do compromisso arbitral também deve observar a clareza e concisão de seus termos. Palavras soltas podem tra- zer algumas dúvidas.

Algumas cláusulas compromissórias men- cionam os termos “sem direito a recurso judicial” ou “as partes, em hipótese alguma não poderão recorrer ao poder judiciário” ou qualquer outra condição parecida que exclui a interferência do poder judiciário, o que poderia se ocorrer por um processo judicial proposto pela parte insatisfeita. 

Nestes casos, o que se pretende é ressaltar o fato de que a sentença arbitral é soberana entre as partes e qualquer recurso ao judiciário, eventualmente demandado pela parte insatisfeita, é inaceitável. De toda forma, a própria Lei Brasileira de Arbitragem já confere plena autonomia à sentença arbitral proferida nos termos legais, considerando a decisão tomada soberana. Recomenda-se apenas que tais termos sejam bem colocados no texto da cláusula compromissória, sem que possam dar margens à dupla interpretação, para se concluir que as partes não podem recorrer ao judiciário, sequer para um procedimento cautelar, o que seria um contrasenso. 

A Constituição Federal de 1988 assegura, a todos os cidadãos brasileiros, pleno e irrestrito acesso ao poder judiciário. No entanto, tal entendimento exclui o ato desesperado de alguém que se sentiu prejudicado por uma sentença arbitral e tenta anular tal decisão ingressando com uma ação anulatória, por exemplo. 

O entendimento majoritário da jurisprudência brasileira é no sentido de que as sentenças arbitrais proferidas não podem ser anuladas pelo poder judiciário, posto que são soberanas e autônomas, já que as próprias partes, segundo a autonomia de suas vontades, decidiram dirimir as controvérsias em juízo arbitral. 

No entanto, tal entendimento não exclui os procedimentos cautelares, assim como não exclui a execução das sentenças arbitrais, que também se opera em âmbito judicial. O que se pretende é ressaltar a importância da cláusula compromissória bem redigida, que contemple a possibilidade de um procedimento cautelar, que se dará no juízo comum. Por isso, é importante também eleger o foro adequado para estes procedimentos, para evitar questionamentos posteriores quanto a competência, o que poderá tornar o processo moroso, justamente o contrário de todas as pretensões das partes ao firmar uma cláusula 

Fonte: Revista Resultado 
Ano 7, no. 35

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