Nossas particularidades
A Lei de Mediação (Lei Federal 13.140/2015), que entrou em vigor em dezembro de 2015, trouxe ao ordenamento jurídico pátrio a regulação do instituto da mediação, que surge como um novo mecanismo legal para solução de conflitos. Inicialmente, imperioso destacar a diferença entre os institutos da conciliação e da mediação.
A Lei de Mediação (Lei Federal 13.140/2015), que entrou em vigor em dezembro de 2015, trouxe ao ordenamento jurídico pátrio a regulação do instituto da mediação, que surge como um novo mecanismo legal para solução de conflitos. Inicialmente, imperioso destacar a diferença entre os institutos da conciliação e da mediação.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça[1], “a Mediação
é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra
e imparcial, facilita o diálogo entre as partes, para que elas
construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução para o
problema. Em regra, é utilizada em conflitos multidimensionais, ou
complexos. A conciliação é um método utilizado em conflitos mais
simples, ou restritos, no qual o terceiro facilitador pode adotar uma
posição mais ativa, porém neutra com relação ao conflito e imparcial”.
Em
outras palavras, na mediação se vê uma sequência de atos que compõem um
procedimento organizado para buscar o restabelecimento da comunicação
entre as partes, de maneira que a reconstrução da comunicação entre eles
os conduzam à solução do conflito ali existente. Desta maneira, não é
possível definir um prazo para findar o procedimento de mediação, que
pode ou não terminar em acordo, pois as partes possuem autonomia para
buscar soluções que compatibilizem seus interesses e necessidades. Em
sentido diverso, na conciliação, se vê um ato único consensual célere,
que busca uma efetiva harmonização das posições das partes, a fim de que
os seus interesses, ainda que de forma parcial, possam convergir.
O sistema do procedimento de mediação instaurado no Brasil se baseia nos conceitos de negociação baseada em princípios,
desenvolvido no Projeto de Negociação de Harvard. Este sistema sugere
que o mediador procure benefícios mútuos sempre que possível, não
interferindo e/ou sugerindo às partes adotar o caminho “x” ou “y”, mas
sim conduzindo o raciocínio e diálogo das partes até que trilhem
naturalmente a rota do caminho “x” ou “y” que melhor atenda o interesse
dos envolvidos.
Ao menos perfunctoriamente, esta diferença parece
inócua, mas na prática, revela-se brutal. Isso porque, no modelo
anterior, qual seja, o da conciliação (totalmente despreparada), não
raras vezes o conciliador sequer sabia o nome das partes, e com os
envolvidos ainda de pé na antessala dos fóruns, formulava a derradeira
pergunta: “Vocês conversaram, possuem um acordo?”. Evidente que tal
modelo está alhures superado, e até mesmo do ponto de vista de senso
comum, não se revela salutar.
É perceptível que, na mediação, há
uma reconstrução do canal comunicativo entre os entes, de modo a exaltar
os pontos positivos anteriormente existentes em suas relações, bem como
tirá-los da defesa aguerrida de suas posições, para que após explanarem
suas opiniões, possam conduzir a construção de uma solução para o
conflito e, aí sim, poderá o mediador questionar as partes: “Vocês
chegaram a um acordo?”. Ao passo que, na conciliação, sem sequer ter
oportunizado momento de diálogo entre os entes, formulando sumariamente
aquela que deveria ser a última pergunta de uma sessão conciliatória,
outro não será o insucesso ou, ainda que profícuo, será baixo o número
de êxito.
Não raras vezes, o cliente questiona o seu patrono:
“Doutor, eu vou poder falar?”. Ora, muitas vezes esta é a única ânsia
que o cliente possui: a de falar; de esvaziar seus sentimentos sobre
aquele conflito. Muitas demandas são geradas apenas por reflexo cultural
do jargão “não levo desaforo para casa”. Inúmeras vezes, as partes não
querem litigar, mas querem um pedido de desculpas, querem ser ouvidas,
querem que o causador daquele conflito saiba que causou o conflito e o
quanto aquele problema é importante para ela(e).
Em 17 de setembro
de 2015, a Associação dos Magistrados Brasileiros elaborou uma
iniciativa denominada Placar da Justiça, para conscientizar sobre o alto
número de processos que chegam ao Judiciário de todo o país, que na
ocasião apontava a existência mais de 105 milhões de processos em
trâmite[2].
Diante
deste cenário, é de se destacar que algumas técnicas de mediação
diferente das de Harvard também se revelam eficazes. É o caso de Sami
Storch, juiz do interior da Bahia, que vem utilizando uma técnica alemã
antes de sessões de conciliação e obteve acordos em 100% dos casos,
evitando que eles se transformassem em processos judiciais[3].
Segundo
o magistrado, o método, chamado Constelação Familiar e criado pelo
teólogo, filósofo e psicólogo alemão Bert Hellinger, contribui
fortemente para o fim do conflito, impactando tanto os atores diretos
quanto os envolvidos indiretamente na causa, como filhos e família.
De
todo o destacado, mais relevante que os esforços do CNJ e dos
tribunais, dos magistrados, advogados, mediadores e conciliadores, é que
esta cultura de paz seja compreendida pela sociedade, mudando seus
hábitos, abandonando a política do “jeitinho brasileiro”, com
honestidade, despendendo efetivos esforços na boa-fé das relações
interpessoais, institucionais e contratuais. Somente com a educação do
nosso povo teremos um Judiciário menos abarrotado, encarando esta
instituição como último recurso para a solução de um conflito, nunca
como o primeiro!
[1] http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-mediacao, acessado em 19/02/2016, às 10h17.
[2] http://www.ajuris.org.br/2015/09/17/placar-da-justica-sinaliza-a-existencia-de-mais-de-105-milhoes-de-processos-no-pais/, acessado em 19/02/2016, às 11h13.
[3] http://www.conjur.com.br/2014-nov-17/juiz-obtem-100-acordos-tecnica-alema-antes-conciliacoes, acessado em 19/02/2016, às 11h18.
Por Edgar Bigolim Fernandes da Silva, é advogado civilista da banca Cerqueira Leite Advogados Associados.
Fonte: ConJur
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