domingo, 4 de maio de 2014

Escritórios ganham clientes com divórcio colaborativo nos EUA

Terminando numa boa
Uma estratégia de negócios relativamente nova vem atraindo mais e mais clientes para escritórios de advocacia especializados em Direito de Família nos Estados Unidos: o “divórcio colaborativo”. Custa um terço — ou menos — do que se gasta com um divórcio litigioso. E as partes sempre saem mais satisfeitas do que se tivessem resolvido suas disputas nos tribunais.
A jornalista Deborah Nason, em uma reportagem para a CNBC, ouviu advogados e consultores de diversas áreas, para entender por que, cada vez mais, casais que querem se separar preferem transformar um divórcio potencialmente litigioso em consensual.
O divórcio colaborativo segue um caminho diferente da mediação ou da arbitragem. Na mediação, nos EUA, o mediador ajuda as partes a tomar as decisões. Na arbitragem, o árbitro toma as decisões, depois de ouvir as partes.
No divórcio colaborativo, o escritório coloca dois advogados especializados à disposição das partes — um para defender os interesses da mulher e outro para defender os interesses do homem. No final, todos, dentro de um ambiente colaborativo, chegam a um acordo.
As outras formas de divórcio, nos EUA, não diferem do Brasil e de muitos outros países. O contencioso (litigation), em que cada parte contrata seu advogado e dão ao juiz o poder de decidir, é tido como muito custoso e emocionalmente exaustivo.
A outra forma é a “pro se” (ou “in pro per”), em que as partes representam a si mesmas. Também é chamada, nos EUA, de “Kitchen table”, porque a mesa de negociações é, normalmente, a da cozinha da casa.
Abordagem multidisciplinar

O atendimento aos clientes no divórcio colaborativo não se atém apenas à assessoria jurídica. É um serviço que atende muito melhor as necessidades do casal e dos filhos, porque o escritório lhe dá uma abordagem multidisciplinar. Isto é, o escritório mobiliza profissionais de outras áreas para ajudar a família a viabilizar, de uma forma mais amena, o processo de desmonte.
Conforme os problemas que são colocados na mesa, ou em casos em que a disputa é mais complexa, o processo do divórcio colaborativo pode ter a participação de alguns consultores inteiramente neutros, como:
– consultor financeiro neutro. Resolver a questão financeira em um divórcio pode ser uma operação complexa, especialmente se uma das partes se sente mais fraca nesse quesito. A insegurança tende a dificultar acordos. Por isso, o consultor financeiro desenvolve um plano lógico para ajudar as partes a equacionar suas vidas financeiras durante o processo de divórcio e depois dele, faz cálculos de pensão alimentícia, etc;
– agente imobiliário. Sozinho ou com a ajuda do consultor financeiro e dos advogados ajuda a decifrar a questão da divisão dos bens, especialmente no que se refere à avaliação de propriedades residenciais e comerciais;
– avaliador comercial ou societário. Junto com os advogados e, provavelmente, o consultor financeiro, ajuda a avaliar o valor de uma empresa ou de quaisquer outros negócios, se for o caso. Essa ajuda é importante, porque a parte menos integrada aos negócios se sente mais esclarecida e confiante e não faz exigências inaceitáveis;
– profissional de saúde mental. A maioria das separações, mesmo que consensual, é um caso de navegação em águas turbulentas, emocionalmente. Esse profissional pode ajudar as partes a fazer a travessia; e
– especialista em crianças. É o defensor, no processo de separação, dos interesses dos filhos. Ajuda os pais a chegar a formas de acordo que protegem as crianças, da melhor forma possível, das agruras do divórcio. E orienta as partes, para que minimizem o drama que os filhos poderão viver.
Os filhos são os “bens” da família que mais necessitam ser preservados em um divórcio, que nunca é um passeio no parque. Por isso, a participação de um “defensor dos inocentes” — e de outros profissionais — pode ter uma grande valia para as partes, que se sentirão muito mais seguras e dispostas a chegar a um consenso.
Em muitos casos, a questão da guarda é facilmente resolvida e as partes podem se concentrar em horários e formas de visita. Além disso, os filhos ficam muito mais tranquilos quando ouvem que os pais vão a um escritório de advocacia para conversar do que a um tribunal, para enfrentar um juiz. A ideia que as crianças têm de tribunal é o da televisão. E não é boa.
Todas essas estratégias tornam o divórcio colaborativo bem atraente, porque a separação se torna mais rápida, menos traumática e muito mais em conta do que a separação por via litigiosa. A um ponto, o contencioso se torna tão caro que a única vontade de cada uma das partes é ganhar — não importa o que aconteça com a outra parte. Se houver colaboração, o processo tem uma boa chance de terminar em um acordo bom para todos. E salvar o relacionamento pós-divórcio.
A presença de outros profissionais pode ser necessária na mesa de negociações. Em alguns casos, pode ser útil, por exemplo, a participação de um contador, de um psicólogo ou de um perito em qualquer área.
Do litigioso para o consensual

O divórcio colaborativo não é consensual, em sua origem. Por definição, é um divórcio litigioso que, por conveniências das partes, tem a aspiração de se tornar consensual. O escritório, por sua vez, aspira a satisfação dos clientes, com todos os benefícios que isso pode trazer para a banca.
O advogado Ross Evan, presidente da Academia Internacional de Profissionais Colaborativos, uma instituição já conhecida no Brasil, diz que a primeira questão que um casal, em via de separação, deve informar o escritório é que tipo de disputa prefere: uma guerra ou uma resolução pacífica? Que advogados o escritório deve mobilizar: da tropa de choque (para o contencioso) ou da equipe de negociação (para o divórcio colaborativo)?
De acordo com a Academia Internacional de Profissionais Colaborativos, há quatro elementos fundamentais na prática colaborativa, dos quais não se pode fugir:
1. A troca voluntária, livre e aberta de informações. Isto é, todos os elementos da disputa devem ser colocados abertamente na mesa de negociação;
2. Renunciar ao litígio. A disputa por via judicial deve ser inteiramente descartada, antes de o processo começar. O acordo deve ser selado e qualquer ruptura desse compromisso, durante o processo, resultará na retirada obrigatória dos dois advogados e dos demais profissionais envolvidos na questão. As partes arcam com os custos ocorridos até então;
3. Todos os profissionais envolvidos, advogados e consultores, devem assumir o compromisso de fazer o melhor de seus esforços e de sua capacidade para buscar o consenso entre as partes, sem ter de recorrer a uma decisão judicial; e
4. As partes, bem como os profissionais, devem se comprometer a respeitar os objetivos, pontos de vista, pensamentos e desejos de cada lado. Mesmo quando não fazem muito sentido. Se esse for o caso, a via de resolução é o esclarecimento.
Honorários e outros custos

Idealmente, os honorários do escritório e os custos dos consultores devem ser estabelecidos com base no tempo empregado na resolução dos conflitos para se chegar ao consenso, dizem os especialistas. Há uma razão muito simples para isso: quanto mais as partes — ou uma as partes — resistem a um acordo, mais custosa se tornará o divórcio. É um tipo de pressão que pode estimular concessões e acordos. 
Por João Ozório de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Fonte: ConJur

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