O Estado e o consensualismo
A disciplina legal da Mediação chegou para nós com a Lei 13.140, de 26/6/2015, publicada no Diário Oficial da União de 29/6/2015. Dispôs sobre a mediação entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
O fato de apenas recentemente termos uma disciplina legal da mediação não se constituiu em entrave para sua aplicação no Brasil, especialmente entre particulares. Mesmo porque a mediação encontra respaldo no texto da Constituição Federal, que, no preâmbulo, ao cuidar das diretrizes do Estado Democrático, prevê a “solução pacífica das controvérsias”.
Inegável, entretanto, a nova dimensão que os instrumentos autocompositivos passaram a ter com a promulgação da lei, notadamente no âmbito do poder público, ainda tímido nessa seara.
Partilhamos da opinião que nossa cultura muito irá se beneficiar com a nova lei, não só em razão da legitimidade que o texto legal confere ao instituto da mediação, mas também face à ampla divulgação que decorre de sua publicação.
A Lei 13.140/2015 veio compor o sistema jurídico brasileiro que disciplina a resolução consensual de conflitos, de forma alternativa ao modelo adversarial consagrado pela via judicial. Soma-se a outros dois comandos normativos, a Resolução 125/2010 do CNJ e o novo Código de Processo Civil.
A bem da verdade, anteriormente à citada lei, foi o Judiciário que imprimiu grande impulso aos métodos alternativos de solução de conflitos, com a introdução da Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, do ano de 2010, que atribuiu à mediação o status de política pública nacional.
A Resolução 125/2010 nasceu no bojo do Poder Judiciário e há uma razão que explica esse fenômeno. O Judiciário é o centro para onde convergem todas as disputas, sendo dele a “palavra final” que o cidadão busca para resolução de seus conflitos.
Na era da modernidade em que nos deparamos com disputas e litígios de toda ordem, e sobretudo após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (“Constituição Cidadã”), são infindáveis as questões que desaguam no Judiciário e que provocaram um congestionamento de tal magnitude que forçou esse poder a buscar um caminho para enfrentar o problema.
Mas o Judiciário não incentivou os métodos de solução de conflitos apenas para desafogar o número de processos, mas também porque sentiu que era tempo de se tornar protagonista da cultura da pacificação social.
A ideia foi mudar o perfil do Judiciário, de forma que se torne um prestador efetivo de serviços voltado ao jurisdicionado. O diferencial trazido pela Resolução 125 foi o acesso à Justiça: o Judiciário se pretende um centro de Justiça organizado pelo Estado, onde o cidadão submete sua disputa e daí é encaminhado ao processo mais adequado para o tipo de conflito, seja pela forma heterocompositiva judicial ou pela forma autocompositiva, essa última devendo sempre ser estimulada.
Seguindo-se à implantação da Resolução 125/2010 e à nova Lei 13.140/2015, veio se agregar, na mesma linha, outro estatuto da maior importância: o novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor aos 18 de março de 2016, quase que simultaneamente à Lei de Mediação, e que consolida o paradigma da conciliação/mediação.
A partir do novo CPC (artigo 174) existe autorização legal para que a administração pública, como regra geral, possa fazer conciliações e mediações judiciais (heterocompositivas) ou extrajudiciais (autocompositivas).
O novo CPC dedica um capítulo todo aos mediadores e conciliadores judiciais (artigos 165 a 175), sendo que no artigo 149 dispõe que mediadores e conciliadores fazem parte do rol de auxiliares da Justiça.
Toda estrutura do código é voltada para o estímulo aos métodos consensuais de solução de conflitos, o que vai de encontro aos anseios da sociedade, que procura uma forma mais célere, mais efetiva e menos custosa para resolver seus conflitos.
A Lei de Mediação e o novo CPC passaram a vigorar quase que simultaneamente. Não apresentam dicotomia nas questões sobre resolução consensual de conflitos; ao contrário, os estatutos se complementam. A criação de Câmaras de Prevenção e Resolução Administrativa de Conflitos, prevista no artigo 32 da Lei 13.140/2015, por exemplo, implementa o que o novo CPC estimula (artigo 174).
Face aos três instrumentos legais mencionados — Resolução 125/2010, Lei 13.140/2015 e novo CPC — encontramos elementos suficientes para o desenvolvimento da cultura da autocomposição, seja na esfera privada ou na esfera pública.
O poder público não poderia ficar fora de tal previsão. A uma, porque, conforme dados do CNJ, mais da metade do número de processos judiciais existentes nos foros do país envolve o poder público, seja como autor, seja como réu. E, a duas, porque hoje nos encontramos numa era de novos princípios da administração, baseada em eficiência e consensualismo.
Não foi à toa que a Lei de Mediação (Lei 13.140/15) cuidou de inserir um capítulo com o título: “DA AUTOCOMPOSIÇÃO DE CONFLITOS EM QUE FOR PARTE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO”.
Encontramos no artigo 32 a previsão de que União, estados, Distrito Federal e municípios poderão criar câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos.
As câmaras, segundo incisos I a III do artigo 32, terão competência para: “I- dirimir conflitos entre órgãos e entidades da administração pública; II- avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de composição , no caso de controvérsia entre particular e pessoa jurídica de direito público; III-promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta”.
De plano verificamos que a lei trouxe a possibilidade de autocomposição de conflitos existentes entre órgãos da própria administração pública, e de conflitos existentes entre particular e pessoa jurídica de direito público. Ficou determinado que o modo de composição e o funcionamento das câmaras será estabelecido em regulamento de cada ente federado; e que a submissão dos conflitos às câmaras é facultativa (parágrafos 1º e 2º do artigo 32).
Embora a lei seja alvo de algumas críticas pontuais, a verdade é que ela foi muito bem recebida pelo mundo jurídico, pelo simples fato de prever mecanismos efetivos de solução de conflitos de maneira consensual, ainda não adotados com frequência pelo poder público.
Trouxe ferramentas inovadoras, como a mediação coletiva de conflitos relacionados à prestação de serviços públicos; a transação por adesão em controvérsias jurídicas mediante autorização do advogado-geral da União com base em jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores, ou mediante parecer do advogado-geral da União aprovado pelo presidente da República; a resolução de conflitos entre particulares perante as agências e órgãos reguladores; a composição de controvérsias jurídico-tributárias perante a Receita Federal.
Ressaltamos o alcance extraordinário que poderá ser obtido com a mediação coletiva de conflitos relacionados à prestação de serviços públicos (por exemplo, serviços de telefonia, energia elétrica). A participação dos consumidores poderá se dar por meio de associações, visando atender os interesses da população, destinatária do serviço público. A solução de forma coletiva será, com certeza, um meio célere que atenderá os interesses dos consumidores de serviços públicos, além de trazer a vantagem de redução do número de demandas judiciais e de reclamações individuais nos órgãos de proteção ao consumidor.
Estabeleceu ainda, de forma expressa, que as câmaras de resolução de conflitos terão competência para solucionar questões que envolvem “equilíbrio econômico-financeiro de contratos celebrados pela administração com particulares”. Pensamos ser de grande utilidade essa iniciativa diante do número expressivo de contratos celebrados pela administração que vislumbram reajustes e aditamentos em função de equilíbrio econômico-financeiro.
O artigo 36 da lei, por sua vez, dispôs que “no caso de conflitos que envolvam controvérsia jurídica entre órgãos ou entidades de direito público que integram a administração pública federal, a Advocacia-Geral da União deverá realizar composição extrajudicial de conflito, observados os procedimentos previstos em ato do Advogado-Geral da União”. Isso significa, em última análise, priorizar a todo custo a via da composição.
Igualmente relevante o alcance da lei ao estabelecer, no artigo 42, a sua aplicação — no que couber — às outras formas consensuais de resolução de conflitos, tais como mediações comunitárias e escolares, e àquelas levadas a efeito nas serventias extrajudiciais, desde que no âmbito de suas competências.
A administração pública não poderia prescindir da forma autocompositiva de conflitos. Tanto que, mesmo antes da promulgação da lei, as formas consensuais, como a mediação, já se aplicavam ao poder público, sob as vestes de Termos de Ajustamento de Conduta, Construção de Consenso.
Certo é que toda e qualquer área de atuação das políticas públicas está sujeita a conflitos de interesses, que se constituem em terreno fértil e propício à utilização dos métodos consensuais de resolução de conflitos.
Dois aspectos se destacam nas políticas públicas. Primeiro: encontramos um pluralismo de atores envolvidos nos projetos públicos, com interdependência entre si e com objetivos muitas vezes conflitantes (por exemplo, instituições governamentais, sociedades civis organizadas, organizações não governamentais, representações comunitárias). Segundo: a execução de políticas públicas defende hoje uma gestão participativa ampla, de tal forma que alguns projetos seriam inviáveis se excluída a parceria travada entre os órgãos públicos e as representações da sociedade civil.
A execução de programas governamentais não encontra êxito senão mediante uma gestão participativa. Por isso mesmo, imprescindível se estabelecer uma coparticipação responsável entre todos os entes envolvidos nos projetos de políticas públicas, seja em área de saúde, educação, meio ambiente, infraestrutura, segurança ou outras.
As duas premissas — vários atores e necessidade de se estabelecer parcerias — sugere, de imediato, a necessidade de um terceiro elemento, um agente externo, capaz de conciliar os interesses e objetivos comuns das diferentes partes, bem como impedir que os interesses conflitantes impeçam seja atingida a finalidade dos projetos públicos. Esse terceiro elemento é o mediador, que irá favorecer o diálogo e consolidar o processo de construção social.
Sabemos que em matéria de políticas públicas, não é tarefa fácil afastar a prevalência dos interesses e normas ditadas pelo poder público. Todavia, a experiência mostrou que soluções verticais, impostas, deixam de ser cumpridas justamente por não atenderem os reais interesses dos participantes.
Os processos de diálogo, por sua vez, buscam soluções consensuais, de modo a se estabelecer a horizontalidade almejada para que as partes se sintam comprometidas e responsáveis pelo acordo construído. É o princípio maior da mediação: protagonismo das partes e responsabilidade pela solução encontrada.
A Lei da Mediação — como é conhecida a Lei 13.140/2015 — acolhe todos os procedimentos consensuais. Cuidou de instituir e estimular um conjunto de mecanismos de autocomposição, dentre eles a mediação, os termos de ajustamento de conduta, a transação por adesão.
Nesse aspecto, podemos afirmar que o texto legal veio de encontro à nova face do poder público no século XXI, onde as palavras de ordem são “administração consensual” ou “consensualismo de resultado.”
As transformações ocorridas no cenário jurídico, econômico e social brasileiro fizeram com que a administração pública sofresse muitas alterações para se adaptar à nova realidade de busca de um consenso mais amplo com a sociedade, promovendo a participação popular na formulação de políticas públicas.
Essa a lição da prestigiada Odete Medauar: “A Administração volta-se para a coletividade, passando a conhecer melhor os problemas e aspirações da sociedade. A Administração passa a ter atividade de mediação para dirimir e compor conflitos de interesses entre várias partes ou entre estas e a Administração” ( in O Direito Administrativo em Evolução, 2ª edição, 2003, pg. 211).
Todo esse panorama revela a fundamental importância da promulgação da Lei 13.140/2015, que regulamentou e valorizou a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
A disciplina legal da Mediação chegou para nós com a Lei 13.140, de 26/6/2015, publicada no Diário Oficial da União de 29/6/2015. Dispôs sobre a mediação entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
O fato de apenas recentemente termos uma disciplina legal da mediação não se constituiu em entrave para sua aplicação no Brasil, especialmente entre particulares. Mesmo porque a mediação encontra respaldo no texto da Constituição Federal, que, no preâmbulo, ao cuidar das diretrizes do Estado Democrático, prevê a “solução pacífica das controvérsias”.
Inegável, entretanto, a nova dimensão que os instrumentos autocompositivos passaram a ter com a promulgação da lei, notadamente no âmbito do poder público, ainda tímido nessa seara.
Partilhamos da opinião que nossa cultura muito irá se beneficiar com a nova lei, não só em razão da legitimidade que o texto legal confere ao instituto da mediação, mas também face à ampla divulgação que decorre de sua publicação.
A Lei 13.140/2015 veio compor o sistema jurídico brasileiro que disciplina a resolução consensual de conflitos, de forma alternativa ao modelo adversarial consagrado pela via judicial. Soma-se a outros dois comandos normativos, a Resolução 125/2010 do CNJ e o novo Código de Processo Civil.
A bem da verdade, anteriormente à citada lei, foi o Judiciário que imprimiu grande impulso aos métodos alternativos de solução de conflitos, com a introdução da Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, do ano de 2010, que atribuiu à mediação o status de política pública nacional.
A Resolução 125/2010 nasceu no bojo do Poder Judiciário e há uma razão que explica esse fenômeno. O Judiciário é o centro para onde convergem todas as disputas, sendo dele a “palavra final” que o cidadão busca para resolução de seus conflitos.
Na era da modernidade em que nos deparamos com disputas e litígios de toda ordem, e sobretudo após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (“Constituição Cidadã”), são infindáveis as questões que desaguam no Judiciário e que provocaram um congestionamento de tal magnitude que forçou esse poder a buscar um caminho para enfrentar o problema.
Mas o Judiciário não incentivou os métodos de solução de conflitos apenas para desafogar o número de processos, mas também porque sentiu que era tempo de se tornar protagonista da cultura da pacificação social.
A ideia foi mudar o perfil do Judiciário, de forma que se torne um prestador efetivo de serviços voltado ao jurisdicionado. O diferencial trazido pela Resolução 125 foi o acesso à Justiça: o Judiciário se pretende um centro de Justiça organizado pelo Estado, onde o cidadão submete sua disputa e daí é encaminhado ao processo mais adequado para o tipo de conflito, seja pela forma heterocompositiva judicial ou pela forma autocompositiva, essa última devendo sempre ser estimulada.
Seguindo-se à implantação da Resolução 125/2010 e à nova Lei 13.140/2015, veio se agregar, na mesma linha, outro estatuto da maior importância: o novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor aos 18 de março de 2016, quase que simultaneamente à Lei de Mediação, e que consolida o paradigma da conciliação/mediação.
A partir do novo CPC (artigo 174) existe autorização legal para que a administração pública, como regra geral, possa fazer conciliações e mediações judiciais (heterocompositivas) ou extrajudiciais (autocompositivas).
O novo CPC dedica um capítulo todo aos mediadores e conciliadores judiciais (artigos 165 a 175), sendo que no artigo 149 dispõe que mediadores e conciliadores fazem parte do rol de auxiliares da Justiça.
Toda estrutura do código é voltada para o estímulo aos métodos consensuais de solução de conflitos, o que vai de encontro aos anseios da sociedade, que procura uma forma mais célere, mais efetiva e menos custosa para resolver seus conflitos.
A Lei de Mediação e o novo CPC passaram a vigorar quase que simultaneamente. Não apresentam dicotomia nas questões sobre resolução consensual de conflitos; ao contrário, os estatutos se complementam. A criação de Câmaras de Prevenção e Resolução Administrativa de Conflitos, prevista no artigo 32 da Lei 13.140/2015, por exemplo, implementa o que o novo CPC estimula (artigo 174).
Face aos três instrumentos legais mencionados — Resolução 125/2010, Lei 13.140/2015 e novo CPC — encontramos elementos suficientes para o desenvolvimento da cultura da autocomposição, seja na esfera privada ou na esfera pública.
O poder público não poderia ficar fora de tal previsão. A uma, porque, conforme dados do CNJ, mais da metade do número de processos judiciais existentes nos foros do país envolve o poder público, seja como autor, seja como réu. E, a duas, porque hoje nos encontramos numa era de novos princípios da administração, baseada em eficiência e consensualismo.
Não foi à toa que a Lei de Mediação (Lei 13.140/15) cuidou de inserir um capítulo com o título: “DA AUTOCOMPOSIÇÃO DE CONFLITOS EM QUE FOR PARTE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO”.
Encontramos no artigo 32 a previsão de que União, estados, Distrito Federal e municípios poderão criar câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos.
As câmaras, segundo incisos I a III do artigo 32, terão competência para: “I- dirimir conflitos entre órgãos e entidades da administração pública; II- avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de composição , no caso de controvérsia entre particular e pessoa jurídica de direito público; III-promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta”.
De plano verificamos que a lei trouxe a possibilidade de autocomposição de conflitos existentes entre órgãos da própria administração pública, e de conflitos existentes entre particular e pessoa jurídica de direito público. Ficou determinado que o modo de composição e o funcionamento das câmaras será estabelecido em regulamento de cada ente federado; e que a submissão dos conflitos às câmaras é facultativa (parágrafos 1º e 2º do artigo 32).
Embora a lei seja alvo de algumas críticas pontuais, a verdade é que ela foi muito bem recebida pelo mundo jurídico, pelo simples fato de prever mecanismos efetivos de solução de conflitos de maneira consensual, ainda não adotados com frequência pelo poder público.
Trouxe ferramentas inovadoras, como a mediação coletiva de conflitos relacionados à prestação de serviços públicos; a transação por adesão em controvérsias jurídicas mediante autorização do advogado-geral da União com base em jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores, ou mediante parecer do advogado-geral da União aprovado pelo presidente da República; a resolução de conflitos entre particulares perante as agências e órgãos reguladores; a composição de controvérsias jurídico-tributárias perante a Receita Federal.
Ressaltamos o alcance extraordinário que poderá ser obtido com a mediação coletiva de conflitos relacionados à prestação de serviços públicos (por exemplo, serviços de telefonia, energia elétrica). A participação dos consumidores poderá se dar por meio de associações, visando atender os interesses da população, destinatária do serviço público. A solução de forma coletiva será, com certeza, um meio célere que atenderá os interesses dos consumidores de serviços públicos, além de trazer a vantagem de redução do número de demandas judiciais e de reclamações individuais nos órgãos de proteção ao consumidor.
Estabeleceu ainda, de forma expressa, que as câmaras de resolução de conflitos terão competência para solucionar questões que envolvem “equilíbrio econômico-financeiro de contratos celebrados pela administração com particulares”. Pensamos ser de grande utilidade essa iniciativa diante do número expressivo de contratos celebrados pela administração que vislumbram reajustes e aditamentos em função de equilíbrio econômico-financeiro.
O artigo 36 da lei, por sua vez, dispôs que “no caso de conflitos que envolvam controvérsia jurídica entre órgãos ou entidades de direito público que integram a administração pública federal, a Advocacia-Geral da União deverá realizar composição extrajudicial de conflito, observados os procedimentos previstos em ato do Advogado-Geral da União”. Isso significa, em última análise, priorizar a todo custo a via da composição.
Igualmente relevante o alcance da lei ao estabelecer, no artigo 42, a sua aplicação — no que couber — às outras formas consensuais de resolução de conflitos, tais como mediações comunitárias e escolares, e àquelas levadas a efeito nas serventias extrajudiciais, desde que no âmbito de suas competências.
A administração pública não poderia prescindir da forma autocompositiva de conflitos. Tanto que, mesmo antes da promulgação da lei, as formas consensuais, como a mediação, já se aplicavam ao poder público, sob as vestes de Termos de Ajustamento de Conduta, Construção de Consenso.
Certo é que toda e qualquer área de atuação das políticas públicas está sujeita a conflitos de interesses, que se constituem em terreno fértil e propício à utilização dos métodos consensuais de resolução de conflitos.
Dois aspectos se destacam nas políticas públicas. Primeiro: encontramos um pluralismo de atores envolvidos nos projetos públicos, com interdependência entre si e com objetivos muitas vezes conflitantes (por exemplo, instituições governamentais, sociedades civis organizadas, organizações não governamentais, representações comunitárias). Segundo: a execução de políticas públicas defende hoje uma gestão participativa ampla, de tal forma que alguns projetos seriam inviáveis se excluída a parceria travada entre os órgãos públicos e as representações da sociedade civil.
A execução de programas governamentais não encontra êxito senão mediante uma gestão participativa. Por isso mesmo, imprescindível se estabelecer uma coparticipação responsável entre todos os entes envolvidos nos projetos de políticas públicas, seja em área de saúde, educação, meio ambiente, infraestrutura, segurança ou outras.
As duas premissas — vários atores e necessidade de se estabelecer parcerias — sugere, de imediato, a necessidade de um terceiro elemento, um agente externo, capaz de conciliar os interesses e objetivos comuns das diferentes partes, bem como impedir que os interesses conflitantes impeçam seja atingida a finalidade dos projetos públicos. Esse terceiro elemento é o mediador, que irá favorecer o diálogo e consolidar o processo de construção social.
Sabemos que em matéria de políticas públicas, não é tarefa fácil afastar a prevalência dos interesses e normas ditadas pelo poder público. Todavia, a experiência mostrou que soluções verticais, impostas, deixam de ser cumpridas justamente por não atenderem os reais interesses dos participantes.
Os processos de diálogo, por sua vez, buscam soluções consensuais, de modo a se estabelecer a horizontalidade almejada para que as partes se sintam comprometidas e responsáveis pelo acordo construído. É o princípio maior da mediação: protagonismo das partes e responsabilidade pela solução encontrada.
A Lei da Mediação — como é conhecida a Lei 13.140/2015 — acolhe todos os procedimentos consensuais. Cuidou de instituir e estimular um conjunto de mecanismos de autocomposição, dentre eles a mediação, os termos de ajustamento de conduta, a transação por adesão.
Nesse aspecto, podemos afirmar que o texto legal veio de encontro à nova face do poder público no século XXI, onde as palavras de ordem são “administração consensual” ou “consensualismo de resultado.”
As transformações ocorridas no cenário jurídico, econômico e social brasileiro fizeram com que a administração pública sofresse muitas alterações para se adaptar à nova realidade de busca de um consenso mais amplo com a sociedade, promovendo a participação popular na formulação de políticas públicas.
Essa a lição da prestigiada Odete Medauar: “A Administração volta-se para a coletividade, passando a conhecer melhor os problemas e aspirações da sociedade. A Administração passa a ter atividade de mediação para dirimir e compor conflitos de interesses entre várias partes ou entre estas e a Administração” ( in O Direito Administrativo em Evolução, 2ª edição, 2003, pg. 211).
Todo esse panorama revela a fundamental importância da promulgação da Lei 13.140/2015, que regulamentou e valorizou a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
Por Angela Teixeira Leite Pacheco Di Francesco é advogada, procuradora do Estado de São Paulo aposentada e conciliadora do TJSP
Fonte: ConJur
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