[Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo desta sexta-feira (27/9)]
O Brasil vive momento especial, marcado por encruzilhadas decisórias que definirão os rumos e o tipo de país que queremos.
Somos impelidos a decidir se avançaremos na direção de uma nação desenvolvida ou se deixaremos que boas oportunidades de transformação sejam desperdiçadas.
Tal definição aplica-se ao sistema de Justiça, obrigando-nos a decidir se trilharemos o caminho de um Judiciário de fácil acesso, célere, inovador e moderno.
Nosso Judiciário é lento, de alta complexidade e difícil compreensão à sociedade. Os dados contundentes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) confirmam: há 90 milhões de processos, ou um para cada dois brasileiros, que demoram em média dez anos para serem concluídos.
Na raiz dessa situação, subsistem antigos problemas — do sistema processual eivado de possibilidades protelatórias à falsa impressão de que é preciso usar linguagem rebuscada em decisões longas. Fatores agravados por uma cultura de litigância ultrapassada.
É imprescindível adotar maneiras de dissolver essa velha cultura, para combatermos na origem os problemas que fazem da Justiça um serviço público ainda aquém do que o Brasil precisa.
A criação de uma comissão de especialistas para elaborar um marco legal de mediação, no âmbito da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, foi decisiva para um novo paradigma do sistema de Justiça, mais próximo da população brasileira.
Muitos processos que aguardam sentença poderiam ter sido resolvidos sem que precisassem chegar ao Judiciário. Os métodos de negociação, conciliação e mediação podem nos socorrer nessa valiosa tarefa, mas a inexistência de um marco regulatório atrasa e dificulta a disseminação de tais técnicas.
É preciso institucionalizar a mediação judicial e extrajudicial como instrumentos consensuais de realização da justiça. Para tanto, a comissão se organizou em três frentes: mediação judicial, mediação extrajudicial e aspectos gerais de mediação, coordenadas, respectivamente, pela ministra Nancy Andrighi, pelo ministro Marco Aurélio Buzzi, ambos do Superior Tribunal de Justiça, e pelo então conselheiro do CNJ José Roberto Neves Amorim.
Trata-se de consolidar o sentimento da justiça consensual, reduzir o volume de processos que chegam diuturnamente aos tribunais e, assim, ampliar as condições para que o Judiciário exerça função predominantemente harmonizadora, apreciando processos mais complexos cujo desfecho só é possível por intervenção de um julgador.
Criar um arcabouço legal para a mediação permitirá também ao Brasil reduzir a distância em relação a outros países no tema.
As experiências de alguns tribunais, especialmente após a resolução nº 125 do CNJ, e na administração pública são salutares.
A Escola Nacional de Mediação e Conciliação (Enam) é iniciativa que atende a essa preocupação, e a elevada procura por cursos que organiza, seja da parte de juízes, procuradores, defensores, advogados ou servidores, mostra que há espaço e urgência na difusão de conhecimentos e práticas de mediação.
Os projetos que tramitam no Congresso Nacional constituem avanços. Mas os trabalhos da comissão de especialistas têm o condão de oferecer subsídios e melhorias à confecção de um marco regulatório moderno, que amplie a segurança jurídica e projete o Brasil como referência na resolução consensual de conflitos.
Aprovar o marco é, por fim, um passo crucial para um sistema de Justiça humanizado e que proporcione adequadamente a defesa dos direitos de cidadãs e cidadãos.
Por Nancy Andrighi é ministra do Superior Tribunal de Justiça.
José Roberto Neves Amorim é desembargador no Tribunal de Justiça de São Paulo, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, coordenador do Movimento pela Conciliação – CNJ.
Flávio Caetano é secretário nacional de Reforma do Judiciário.
Marco Aurélio Buzzi é ministro do Superior Tribunal de Justiça
Fonte: ConJur
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