Há quatro meses, foi constituída Comissão de Juristas para estudar a possível reforma da lei 9.307/96 (LBA), que regulamenta o instituto da arbitragem no Brasil. Segundo o presidente da Comissão, Ministro Luis Felipe Salomão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o objetivo dos trabalhos é de oferecer à sociedade um diagnóstico sobre diversos temas afetos à arbitragem com vistas a propor alterações na LBA.
Temas relacionados à arbitrabilidade objetiva, tais como societário, consumo e laboral, passando pela arbitrabilidade subjetiva, como a participação de entes públicos, e um amplotour procedimental, iniciando na fase de nomeação de árbitros até a momento pós-sentença fazem parte dos trabalhos. Indubitavelmente, todo o estudo que visa a melhorar o instituto da arbitragem deve ser aplaudido. No presente caso, parece-nos que a Comissão está defronte de uma mesma moeda em que um lado apresenta aplausos e outro preocupação.
Embora vários temas têm sido objeto de construção doutrinária e jurisprudencial sólida e entidades como o Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) e Conselho Nacional de Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima) já tenham se debruçado sobre semelhante pesquisa, o lado elogiável da iniciativa fica por conta da excelência do grupo escolhido e da pretendida radiografia sobre temas de relevo, após quase 17 anos de experiência arbitral no país. O viés de preocupação é corolário do anterior. O que fazer com o resultado da pesquisa para enfrentar eventual mal uso, abuso ou insuficiente uso da LBA? Sugerir alteração ou não na LBA? Este é o nó shakesperiano que se coloca à frente da Comissão.
Temas relacionados à arbitrabilidade objetiva, tais como societário, consumo e laboral, passando pela arbitrabilidade subjetiva, como a participação de entes públicos, e um amplotour procedimental, iniciando na fase de nomeação de árbitros até a momento pós-sentença fazem parte dos trabalhos. Indubitavelmente, todo o estudo que visa a melhorar o instituto da arbitragem deve ser aplaudido. No presente caso, parece-nos que a Comissão está defronte de uma mesma moeda em que um lado apresenta aplausos e outro preocupação.
Embora vários temas têm sido objeto de construção doutrinária e jurisprudencial sólida e entidades como o Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) e Conselho Nacional de Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima) já tenham se debruçado sobre semelhante pesquisa, o lado elogiável da iniciativa fica por conta da excelência do grupo escolhido e da pretendida radiografia sobre temas de relevo, após quase 17 anos de experiência arbitral no país. O viés de preocupação é corolário do anterior. O que fazer com o resultado da pesquisa para enfrentar eventual mal uso, abuso ou insuficiente uso da LBA? Sugerir alteração ou não na LBA? Este é o nó shakesperiano que se coloca à frente da Comissão.
O Brasil, sobretudo nos últimos cinco anos, tornou-se uma New Land of Opportunities para o investidor estrangeiro. Estabilidade política e econômica, se comparado a países vizinhos e maior identidade cultural, se comparado a outros membros do Bric, oferecem aos estrangeiros uma indisfarçável curiosidade em participar de projetos de infraestrutura – e suas ramificações – independentemente dos mega eventos esportivos por vir. Este cenário positivo está alicerçado em outro fundamento importante: a segurança jurídica trazida pela LBA e a interpretação adequada que dela vem fazendo o STJ. A LBA e o STJ têm contribuído para diminuir o risco dos investimentos estrangeiros no Brasil. Ou colocado de outra forma, a LBA e e STJ têm contribuído para atrair investimentos sustentáveis no Brasil.
Por certo, a consequência natural do maior número de investimentos é o crescente número de arbitragens. Igual consequência é um maior número de questionamentos sobre temas palpitantes surgidos antes, durante e depois do processo arbitral. Devemos quedar-nos orgulhosos em participar – em diversos foros – de debates profundos que a todo sistema jurídico hoje afeta. Graças a LBA e o trabalho dos militantes da arbitragem, o Brasil se acha em pé de igualdade com os principais centros avançados no mundo. Por evidente, a arbitragem – apesar das suas interessantes vantagens – termina com uma decisão que torna um dos usuários naturalmente insatisfeito, tanto na seara doméstica quanto internacional. Estes dois fatores – explosão de seu uso, somado a insatisfação de alguns por resultados adversos – parece ter desencadeado uma sensação de dever mudar para melhorar. E aqui novamente debruçamo-nos no impasse shakesperiano.
Extraídas as naturais dificuldades inerentes dos regimes democráticos no trato da gestação de qualquer iniciativa legislativa, a LBA está cumprindo exemplarmente a sua missão. É voz assente entre os arbitralistas que a LBA apresenta defeitos, como qualquer obra humana. No entanto, foi esculpida de forma a tirar o Brasil de um ostracismo secular, recebendo ampla influência da flexível e multi-estudada Lei Modelo da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (Uncitral). Lembro-me há 20 anos as emendas e destaques retrógrados que batiam à porta do Congresso para engessar o então projeto de lei de arbitragem brasileiro. Como se diz no jargão popular, todos sabemos como um projeto de lei entra no parlamento, mas poucos sabemos o que lá se passa e como, quando e de que forma sai. Por óbvio, a LBA não é – nem deve ser – imutável, mas é preciso refletir se o momento é adequado para câmbios legislativos, e se os problemas eventualmente detectados o são em decorrência da percepção de anacronismo da LBA. Ainda que o seja, questão seguinte será saber se o que se pretende que ela venha a contemplar impõe a que seja alterada.
No contexto comparado, tomemos como exemplo o Federal Arbitration Act (FAA) estadunidense de 1925. Ao longo dos seus 87 anos de vigência, o judiciário americano vem moldando a sua aplicação, em que pese não faltarem vozes para legislativamente alterá-la. Guardadas as proporções decorrentes da diferença de sistemas, o STJ também vem exemplarmente moldando a aplicação da LBA. Com uma lei centenária, os EUA continuam sendo um centro estável e sólido na atração de arbitragem. É pacífico entre os especialistas americanos que a abertura de um novo processo legislativo para alterar a FAA – por mais louvável que seja a iniciativa – tenderá a abrir uma caixa de Pandora com resultados incertos e, junto com eles, incertezas jurídicas para os usuários. A propósito, existe perante o Congresso americano um projeto de lei denominado Arbitration Fairness Act, cujo objetivo é restringir a arbitrabilidade em contratos de franquia, trabalhistas, relações de consumo e naqueles em que há diferente poder de barganha entre as partes. Tal projeto tem enfrentado fortes resistências da comunidade arbitral local que teme a fuga de arbitragens, com prejuízos ao país.
A Inglaterra, a exemplo do Brasil, aprovou nova lei de arbitragem em 1996. Ao contrário do Brasil, a nova lei inglesa veio para compilar a colcha de retalhos então existente: uma lei de 1950 destinada a arbitragens domésticas e a Lei de 1975 destinada a arbitragens internacionais. Estes dois corpos legislativos, somados a experiência das cortes inglesas ao cabo de várias décadas culminou com a lei de 1996. Não há fumaça de pleito de mudança, adequação ou modernização. No entanto, os desafios que os tribunais ingleses enfrentam quando chamados a manifestar-se sobre questões arbitrais não diferem, na essência, daqueles ora ocorridos no Brasil.
Em obediência à nossa história e cultura, achamos que a letra crua da lei deve se modernizar para atender os anseios – muitas vezes legítimos – do momento. Normalmente enxerga-se a lei boa como a lei nova. Consequentemente, o legislador fica eternamente correndo atrás dos avanços e mudanças trazidos pela sociedade civil. Trata-se de um esforço de Sísifo, às vezes justificado. Convivemos com uma provisão enorme de leis que visam a regulamentar novas situações ou alterar as já existentes. Consequentemente, e de forma anedótica, diferenciamos as leis que pegam das que não pegam. A LBA pegou. Cabe, salvo melhor juízo, deixar o Judiciário moldá-la melhor. Mas, se não conseguirmos nos desgarrar da herança cultural e se entenda necessária a sua mudança, que partamos da Lei Modelo da Uncitral, no lugar de reinventarmos a roda. Enquanto isso, resta-nos o impasse shakesperiano. Oxalá, a Comissão ofereça à comunidade arbitral nacional e internacional a resposta correta a tal instigante dilema.
Por Maurício Gomm Santos
Fonte: ConJur
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