sábado, 6 de abril de 2013

Cobrança de dívida já paga e cobrança de débito indevido

Como decidir
O que ocorre quando alguém é cobrado por dívida já paga ou por débito indevido?
  
O Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor possuem dispositivos tratando sobre o tema, no entanto, com algumas diferenças. Vamos conhecer um pouco mais sobre o assunto?

CÓDIGO CIVIL
Imagine a seguinte situação:
Érico ajuizou ação de cobrança contra Marcelo por um suposto débito de 10 mil reais.
Marcelo contestou a demanda provando que já havia pago a dívida. Além disso, na contestação, Marcelo pediu que Érico fosse condenado a pagá-lo 20 mil reais em razão de estar cobrando uma dívida já quitada.

Esse pedido de Marcelo encontra amparo na legislação?
SIM. Há previsão expressa no Código Civil:
Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.
 
Obs1: essa penalidade do art. 940 deve ser aplicada independentemente da pessoa demandada ter provado qualquer tipo de prejuízo. Assim, ainda que Marcelo não comprove ter sofrido dano, essa indenização é devida.
 
Obs2: a penalidade do art. 940 exige que o credor tenha exigido judicialmente a dívida já paga (“demandar” = “exigir em juízo”).
 
Para que Marcelo cobrasse esse valor em dobro seria necessária reconvenção ou ele poderia fazer isso por meio de mera contestação?
O pedido poderia ser feito por meio de contestação.
Segundo o STJ, a aplicação da penalidade do pagamento do dobro da quantia cobrada indevidamente pode ser requerida por toda e qualquer via processual. Assim, não depende da propositura de ação autônoma ou de que a parte a requeira em sede de reconvenção (REsp 1.005.939-SC).
 
Sempre que houver cobrança de dívida já paga haverá a condenação do autor à penalidade do art. 940 do CC?
Não, nem sempre. Segundo a jurisprudência, são exigidos dois requisitos para a aplicação do art. 940:
a) Cobrança de dívida já paga (no todo ou em parte), sem ressalvar as quantias recebidas;
b) Má-fé do cobrador (dolo).
 
Essa exigência da má-fé é antiga e vem desde o CC-1916, onde esta penalidade encontrava-se prevista no art. 1.531. Veja o que o STF já havia decidido naquela época:
Súmula 159-STF: Cobrança excessiva, mas de boa fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do Código Civil (atual art. 940).
 
Se Érico tivesse desistido da ação de cobrança antes de Marcelo apresentar contestação, isso o eximiria do pagamento da penalidade do art. 940 do CC?
SIM. O CC prevê que a indenização é excluída se o autor desistir da ação antes de contestada a lide:
 
Art. 941. As penas previstas nos arts. 939 e 940 não se aplicarão quando o autor desistir da ação antes de contestada a lide, salvo ao réu o direito de haver indenização por algum prejuízo que prove ter sofrido.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Previsão no CDC
O Código de Defesa do Consumidor possui uma regra semelhante, mas que apresenta peculiaridades. Assim, se o consumidor for cobrado em quantia indevida e efetuar o pagamento, terá direito de receber valor igual ao dobro do que pagou em excesso. Veja:
 
Art. 42 (...)
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
 
Requisitos para aplicar essa penalidade:
a) Consumidor ter sido cobrado por quantia indevida;
b) Consumidor ter pago essa quantia indevida (o CDC exige que o consumidor tenha efetivamente pago e não apenas que tenha sido cobrada);
b) Não ocorrência de engano justificável por parte do cobrador.
 
Engano injustificável
Exemplo de engano justificável: cobrança com base em lei ou cláusula contratual mais tarde declarada nula pela Justiça.
Exemplo de engano injustificável: concessionária de água e esgoto que cobra taxa de esgoto em local onde o serviço não é prestado.
 
Devolução simples
Se tiver havido engano justificável por parte do cobrador, este continuará com a obrigação de devolver as quantias recebidas indevidamente, no entanto, essa devolução será simples (ou seja, não será em dobro).
 
COMPARAÇÃO
 
Código Civil
Código de Defesa do Consumidor
a) Cobrança judicial de dívida já paga;
b) Má-fé do cobrador (dolo).
a) Cobrança de quantia indevida;
b) Pagamento pelo consumidor da quantia indevida;
c) Não ocorrência de engano justificável por parte do cobrador.

Exercícios

1) (Juiz TJPR – 2012) Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição. (     )

2) (Juiz TJDFT – 2012) Aquele que demandar por dívida já paga, ficará obrigado a pagar ao devedor o dobro do que houver cobrado, ainda que o autor desista da ação. (     )

3) (Promotor MP/TO – 2012) Segundo o direito consumerista brasileiro, o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que lhe tiver sido cobrado em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. (     )

4) (Juiz TJ/MG – 2011) O consumidor cobrado em quantia indevida tem o direito à repetição do indébito, sempre por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais. (     )

5) (Juiz TJ/ES – 2012) Ainda que determinada cobrança indevida tenha por base norma posteriormente considerada ilegal pela jurisprudência, cabe a restituição em dobro ao consumidor. (     )

6) (Juiz Federal – TRF 1 – 2011) Não configura erro justificável a cobrança de tarifa de esgoto por serviço que não tenha sido prestado pela concessionária de serviço público, não devendo, portanto, os valores indevidamente cobrados do usuário ser restituídos em dobro. (     )

Gabarito:

1. C
2. E
3. E
4. E
5. E
6. E


Fonte: Dizer o Direito

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