sábado, 4 de maio de 2013

Dicas rápidas de Direito do Consumidor: atraso em conta de água relativa ao antigo morador do imóvel

Imagine a seguinte situação:
Você compra a casa de João.

Ocorre que João vendeu a casa, mas deixou um débito de três meses da conta de água.

A concessionária ingressou com uma ação de cobrança contra você, alegando que, como comprou a casa, passou a ser o devedor, considerando tratar-se de obrigação propter rem.

Para piorar o cenário, a concessionária suspende o fornecimento da água.

Agiu de forma correta a concessionária de água?

NÃO. O débito de água é de natureza pessoal, não se vinculando ao imóvel.
Não se trata, portanto, de obrigação propter rem.

Desse modo, você não pode ser responsabilizado pelo pagamento de serviço de fornecimento de água utilizado por outra pessoa (em nosso exemplo, João).

Nesse sentido, decidiu recentemente a 1ª Turma do STJ: AgRg no REsp 1.313.235-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 20/9/2012.

Obs: esse raciocínio pode ser aplicado também para os casos de fornecimento de energia elétrica, de telefone fixo ou de TV a cabo.

A concessionária pode “cortar” a água (suspender o fornecimento do serviço) nesse caso?

NÃO. Explico esse tema por partes:

Regra:
Em regra, é possível que a concessionária de serviço público interrompa a prestação do serviço, em caso de inadimplemento do usuário, desde que haja aviso prévio. Isso está expressamente previsto no art. 6º, § 3º, da Lei n.° 8.987/95.

Algumas situações especiais em que a concessionária NÃO pode suspender o fornecimento de água mesmo havendo atraso no pagamento:

1) Quando os débitos em atraso foram contraídos pelo morador anterior (STJ AgRg no AG 1399175/RJ);

2) Quando os débitos forem antigos (consolidados no tempo). Isso porque, segundo o STJ, o corte de serviços essenciais, como água e energia elétrica, pressupõe o inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo, sendo inviável, pois, a suspensão do abastecimento em razão de débitos antigos (STJ AgRg no Ag 1351353/RJ);

3) Quando o débito for decorrente de fraude no medidor de consumo de água ou energia elétrica (vulgo “gato”), apurada unilateralmente pela concessionária. Nesse caso, deve a concessionária utilizar-se dos meios ordinários de cobrança (STJ AgRg no AREsp 101.624/RS), considerando que será necessário o consumidor defender-se dessa suposta fraude.

Desse modo, em nosso exemplo, a concessionária não poderia cortar a água da sua casa.

Na contestação, você poderia invocar o Código de Defesa do Consumidor? Aplica-se o CDC ao serviço de fornecimento de água, esgoto e energia elétrica?

SIM. Posição tranquila do STJ.

O que o juiz deveria fazer com a ação proposta pela concessionária contra você?

Deveria extinguir o processo sem resolução do mérito, considerando que você é parte ilegítima (art. 267, VI, do CPC).

Última pergunta:

O que é uma obrigação propter rem?
Consiste em uma obrigação que se vincula a uma coisa, acompanhando-a (daí ser também conhecida como obrigação ambulatória).

Se a obrigação é propter rem, a pessoa assume uma prestação (obrigação de dar, fazer ou não fazer) em razão da aquisição de um direito real. Ex: “A” compra uma casa e, por esse simples fato, passa a ser devedor do IPTU relativo a esse imóvel, ainda que o débito seja anterior à compra.

Outro exemplo de obrigações propter rem são os direitos de vizinhança.

As obrigações propter rem são também chamadas de simbióticas, mistas ou híbridas porque possuem características tanto de direito real como de direito pessoal.
Fonte: Dizer o Direito

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