Ao
abrir as portas para que as pessoas resolvam seus litígios de menor
complexidade com mediadores, a Justiça dos Estados Unidos encontrou
uma maneira de, ao mesmo tempo, atender melhor os jurisdicionados e
desafogar a demanda sobre o próprio Judiciário. A opinião é de
Rachel Wohl, especliasta americana em Resolução Alternativa de
Disputas, que participou do seminário "Conciliação e
Mediação: Estruturação da Política Judiciária Nacional, na
Fundação Armando Álves Penteado, em São Paulo.
A
mediação apareceu formalmente nos Estados Unidos na década de
1970. Desde então, os métodos se desenvolveram tanto que acabaram
por criar um mercado extrajudicial privado, formado por advogados,
juízes especializados e até mesmo por mediadores profissionais.
Segundo a especialista americana em Resolução Alternativa de
Disputas, Rachel Wohl o movimento foi natural.
Existe
nos EUA um dispositivo que permite ao juiz encaminhar as pessoas a
audiências de conciliação. Esses conciliadores, ou mediadores,
ganham entre US$ 200 e US$ 300 por hora — pouco em relação aos
honorários de um advogado, segundo a especialista. Os mediadores de
tribunais são juízes aposentados, ou advogados que preferiram ir
para essa área. Eles atuam em casos de menor complexidade, como
disputas familiares, brigas entre vizinhos e reclamações de
consumidores.
As
causas que envolvem empresas e grandes valores são resolvidas fora
das cortes. Rachel conta que, nesses casos, as partes procuram alguém
cuja reputação em audiências mediadas seja conhecida no mercado
para ajudá-las a costurar um acordo. São os chamados mediadores
profissionais. De acordo com Rachel, além da aptidão para achar
soluções pacíficas, eles têm atribuições técnicas
desenvolvidas em cursos específicos, ministrados por mediadores mais
experientes. Os mediadores profissionais chegam a custar US$ 1,5 mil
a hora, muito mais caro que um advogado ou funcionário de tribunal.
O
que contribui para a atuação dos mediadores é o fato de o
procedimento dos acordos "não ser nada sofisticado",
segundo Rachel. Ela explica que, à medida que se percebeu que era
possível chegar a soluções pacíficas, de forma mais rápida,
confidencial e altamente customizada, a própria população passou a
preferir enfrentar a outra parte numa mesa de conciliação.
Do
lado do Judiciário, o amplo uso das soluções extrajudiciais ajudou
os magistrados a se voltarem apenas para questões consideradas
essenciais — as que envolvem diretamente o interesse social. Em
Baltimore, estado em que Rachel atua, a taxa de sucesso das
audiências de conciliação é de cerca de 70%. Em nível nacional,
fica entre 60% e 75%.
Mais
profundidade
Se
a especialista Rachel Wohl só tem a comemorar sobre os avanços da
mediação em seu país, a professora portuguesa de processo civil,
Paula Costa e Silva, avalia que o método deve ser encarado com mais
profundidade pela Justiça de Portugal.
Lá,
existem duas modalidades de mediação: as pré-processuais e as
intraprocedimentais. O primeiro caso, apesar de realizado dentro do
Tribunal de Justiça, acontece antes de as partes se apresentarem
perante o juiz. A mediação intraprocedimental é orientada pelo
juiz. Se ele decidir que o conflito pode ser resolvido com um acordo,
suspende a audiência e recomenda a conversa entre as partes.
O
grande problema, segundo Paula, é que não há prazo para se chegar
à conclusão de que um acordo é impossível — e a consequente
retomada do processo. Depende da decisão dos envolvidos. A
processualista acredita que esse ponto deve ser analisado pelos
juristas portugueses, pois a mediação é a melhor forma de se
resolver um conflito. "É uma decisão autônoma, sem a
arbitrariedade do Estado. Por mais que o acordo seja péssimo, a
pessoa pode dizer 'Eu sei, mas fui eu que fiz', e é isso que
restaura a paz social", defende.
Problemas
transnacionais
Paula
Costa e Silva conta que o uso da mediação nos tribunais é um tema
que divide a comunidade jurídica europeia. Segundo ela, os métodos
foram decididos em um debate fechado, do qual participou apenas uma
"comunidade fechada de juristas".
Essa
discussão não resolveu o que Paula considera uma das coisas mais
terríveis da Europa: a divergência de temas processuais entre os
países. Ela explica que as leis processuais europeias evoluíram de
forma independente, e nunca num sentido convergente.
Por
isso, ela afirma que é muito difícil mediar conflitos em que há
dois países envolvidos. "Juntam-se dois Estados fortes, cada
qual com sua cultura e regras processuais, e a conciliação fica
impossível."
Fonte:
Justiça Restaurativa em Debate
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