Rumo a virada cultural
O presidente em exercício do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo
Lewandowski, afirmou, nesta quinta-feira (14/8), em Brasília, que “o
século XXI é o século do Poder Judiciário, em que a humanidade, bem como
o povo, o homem comum, descobriu que tem direito e quer efetivá-lo”.
Ele acrescentou que, diante da crescente demanda por Justiça, os
magistrados devem mudar a mentalidade e buscar formas alternativas de
solução de conflitos, não privilegiando apenas o ajuizamento de
processos judiciais.
O ministro abordou o tema após assinar com o presidente da
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos
Costa, e representantes de diversas instituições o Protocolo de
Cooperação para a difusão da Justiça Restaurativa em todo o país. Criada
há dez anos, essa prática consiste na adoção de medidas voltadas a
solucionar, de forma alternativa, situações de conflito e violência,
mediante a aproximação entre vítima, agressor, suas famílias e a
sociedade na reparação e na conciliação dos danos causados por um crime
ou infração penal.
Durante entrevista coletiva, Ricardo Lewandowski citou o livro “A era
dos direitos”, do filósofo e historiador italiano Norberto Bobbio,
segundo o qual, na transição entre os séculos XX e XXI, o mundo passou a
viver a era dos direitos, com o Poder Judiciário assumindo papel
fundamental. Ele lembrou que o Século XIX, com o triunfo das revoluções
liberais, foi o século do Poder Legislativo, “o grande órgão de
expressão da vontade do povo”. Já no Século XX, acrescentou, em função
das revoluções e das guerras, o Poder Executivo se tornou o mais apto a
enfrentar os grandes desafios da época. “Mas o Século XXI é o Século do
Poder Judiciário”, assinalou.
Ricardo Lewandowski também destacou que a Constituição de 1988 marcou
a profunda transição na democracia, antes representativa e agora
participativa. Segundo ele, a Carta Magna, no parágrafo 1º, do artigo
1º, assenta que todo o poder emana do povo, devendo ser exercido por
representantes eleitos ou diretamente. “Isso significa que o povo
brasileiro exerce o poder, participa da gestão da coisa pública, seja
nos setores da educação, da cultura, esporte, meio ambiente e, agora, no
âmbito do Poder Judiciário”, frisou o ministro.
Ele alertou, no entanto, que essa mudança trouxe consigo um aumento
expressivo no volume de demandas judiciais. “É um problema que o
sociólogo português Boaventura de Sousa Santos chamou de explosão de
litigiosidade. Só no Brasil nós temos quase cem milhões de processos em
tramitação para apenas 18 mil juízes, dos tribunais federais, estaduais,
trabalhistas, eleitorais e militares”, afirmou. Para o ministro, os
magistrados, diante desse contexto, devem buscar outras formas para a
solução dos conflitos sociais, por meio, por exemplo, da mediação, da
conciliação, da arbitragem e da Justiça Restaurativa.
“Para que nós possamos dar conta desse novo anseio por Justiça, dessa
busca pelos direitos fundamentais, é preciso mudar a cultura da
magistratura, mudar a cultura dos bacharéis em Direito, parar com essa
mentalidade, essa ideia de que todos os conflitos e problemas sociais
serão resolvidos mediante o ajuizamento de um processo. Nós precisamos
buscar meios alternativos de solução de controvérsias. Nós precisamos
buscar não apenas resolver as questões litigiosas que se multiplicam na
sociedade através de uma decisão judicial, mas sim buscar formas
alternativas, devolvendo para a própria sociedade a solução de seus
problemas”, declarou.
Segundo o presidente em exercício do CNJ, é necessário que hoje o
magistrado tenha não apenas a inteligência técnico-jurídica,
conhecimento do processo, do Direito material, civil, penal ou militar.
“Ele precisa ter inteligência emocional ou, mais do que isso, a
sensibilidade social, porque, afinal de contas, a grande missão hoje do
Poder Judiciário é dar concretização aos direitos sociais e garantir a
paz social”, declarou Ricardo Lewandowski, destacando que o CNJ dará
total apoio à difusão da Justiça Restaurativa, uma iniciativa da
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).
“Uma iniciativa que não parte da cúpula para a base, mas da base para
a cúpula”, frisou o ministro. “Devemos, como dizia Confúcio (pensador e
filósofo chinês), deixar desabrochar mil flores; é preciso que nós
deixemos que essas iniciativas provindas da base possam vingar e
sensibilizar a cúpula das instituições brasileiras”, concluiu.
Por: Jorge Vasconcellos
Fonte: CNJ
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