segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Entrevista com o Professor Giuseppe de Palo

Análise dos fatos
Os números da Justiça brasileira impressionam: são mais de 90 milhões de processos tramitando e que levam, em média, uma década, para serem resolvidos. É como se uma em cada duas pessoas no Brasil estivesse em julgamento. Some-se a isso um aparato insuficiente de juízes (20 mil), promotores (13 mil) e defensores públicos (6,5 mil), comparado ao exército de advogados que milita nas ruas – nada menos do que 757 mil na ativa e 725 matriculados em cursos de Direito. O secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Flávio Crocce Caetano, alerta que esses números podem gerar um “apagão judicial” no Brasil. Frente a esse cenário, os níveis de sucesso, quando aplicadas as técnicas de mediação chegam a 80% nas causas cíveis e a 90% nas de família. 

RESULTADO: Como preservar o relacionamento mediante a importância dos resultados pretendidos em uma negociação comercial?
DE PALO: Muitas vezes as pessoas pensam na negociação em termos de resultados versus relacionamento, como em um jogo de soma zero, onde um ganha na mesma proporção que o outro perde. Ao contrário, as boas relações não são necessariamente estabelecidas por parâmetros de “troca”, ou seja, dando um desconto maior por causa do que está sendo apreciado por sua contraparte. Bons relacionamentos são baseados no respeito, na previsibilidade (que inclui definir certas regras, e, claro, respeitá-las primeiramente por nós mesmos!) e comportamento ético. Além da reputação, os relacionamentos são um dos bens mais valiosos do negociador, uma espécie de “bagagem” que “viaja” com você por toda a vida.

RESULTADO: Na sua opinião quais são as habilidades que uma pessoa teve ter para ser um bom negociador?
 DE PALO:Empatia, capacidade de ouvir e capacidade de fazer pedi- dos de forma adequada são, possivelmente, as competências-chave, além de muita criatividade. Elas são muito mais fácil de dizer do que de fazer. Encontrar alguém que domina essas habilidades é difícil porque são necessários anos de treinamento e prática. O talento natural, é claro, representa uma grande vantagem. No entanto, o talento sozinho não permite que alcancemos o nosso melhor desempenho.

RESULTADO: Quais aspectos devem ser levados em consideração na hora de planejar uma negociação?
DE PALO:A chave é se concentrar no outro lado. Com isso, quero dizer concentrar-se também no outro lado, partindo do pressuposto de que um negociador sabe muito bem a sua própria posição e quais são seus interesses. Como consultor de negociação, o que vejo com frequência é uma total falta de atenção. Um exemplo claro é em relação à falta de atenção quanto à MAAN do outro lado, uma sigla que significa a Melhor Alternativa ao Acordo Negociado, ou seja, o que o outro lado fará se a negociação falhar. Ao nos perguntarmos: “O que eles vão fazer se eu disser não”, podemos ter uma noção mais clara da nossa capacidade de negociação. Na maioria das vezes, os negociadores se concentram exclusivamente em sua própria alternativa, ou a falta dela. Como consequência, quando as coisas ficam difíceis, eles tendem a aceitar ofertas que estão apenas um pouco acima do mínimo aceitável, isto é, apenas um pouco acima do seu valor de reserva, como o chamamos. Ao fazer isso, esses negociadores despreparados deixam potencialmente um monte de dinheiro na mesa para o outro lado levar.

RESULTADO: Quais são os erros mais frequentes cometidos por um negociador sem preparo?
DE PALO: Falar muito ao invés de escutar. Não verificar hipóteses e não ser criativo. A maioria destes erros, e, certamente, os mais caros, devem ser atribuídos à falta de preparação. Este aspecto é fundamental e isso nunca vai ser suficiente ressaltado. A prova disso vem tanto da literatura de negociação como da experiência com participantes em cursos de negociação: grupos que estão devidamente instruídos a respeito de como se preparar em simulações de negociação, e com o tempo suficiente para fazer isso, geram sistematicamente acordos muito melhores do que o outros grupos que não se prepararam.

RESULTADO: Qual a importância da linguagem não verbal e quais aspectos merecem maior cuidado?
DE PALO: Comunicação verbal e não-verbal é um fator chave na vida e não apenas na mesa de negociação. Nós formamos uma impressão sobre a pessoa que se senta do outro lado da mesa em menos de um minuto. Para os negociadores inexperientes, especialmente, o problema não é só não estar conscientes dos sinais que estão sendo enviados, mas também interpretar mal os sinais do outro lado e chegar, muito rapidamente,à conclusão errada sobre o outro lado.

RESULTADO: Algum conselho para encerrar uma negociação?
DE PALO:Como se costuma dizer na Turquia: “deixe uma boa impressão ... porque você pode voltar”.

RESULTADO: Hoje a mediação começa a ser vista como uma forma eficiente para solucionar disputas entre empresas, o senhor acredita que a mediação terá também o mesmo sucesso na resolução de conflitos intra-empresariais?
DE PALO:A mediação intra-organizacional está se tornando cada vez mais popular, como mostra o aumento do número de organizações, de todos os tamanhos, quanto a ter serviços de ouvidoria, por exemplo. A importância da mediação intra-organizacional pode ser facilmente demonstrada. De fato, em uma negociação comercial normalmente eu sempre posso encontrar uma alternativa (outro cliente, outro fornecedor, etc). Porém, quando o departamento de marketing não concorda com o departamento de produção, você acha que eles podem ir todas as vezes para o CEO para ajudá-los a descobrir uma solução? É evidente que não. Tampouco podem procurar um outro departamento com as mesmas funções dentro da empresa. Eles precisam negociar e, se necessário, com a ajuda de um terceiro especializado em promover um ambiente adequado para negociações produtivas.

*  Presidente do ADR Center, maior provedor de serviços de resolução consensual de conflitos da Itália e o segundo maior da Europa; Membro da JAMS Internacional, a mais conceituada organização de mediação e arbitragem em nível mundial; Professor de Negociação e Mediação da HamlineUniversity, 4o lugar no ranking das dez mais conceituadas universidades na categoria de negociação e mediação dos EUA. Negociador internacional auxiliando empresas em mais de 500 causas comerciais complexas. Membro do conselho editorial do Negotiation-Journal da Harvard. Iniciador do projeto mundial “RethinkingNegotiationTeaching”

Fonte: Revista Resultado

Nenhum comentário:

Postar um comentário